Foto – Sergio Camargo
Presidente que liberar uso de fundos públicos para gastos com outras finalidades
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quer usar os recursos do saldo financeiro de oito fundos públicos, estimado em R$ 39 bilhões no ano passado, da forma como melhor lhe aprouver no período entre 2025 e 2030. É o que destaca o jornal O Estado de S. Paulo em editorial desta quinta-feira, 5.
O dispositivo consta de um projeto de lei complementar enviado pelo Executivo ao Congresso e vai autorizar a “livre aplicação” do superávit gerado pelos fundos, destinando recursos cuja aplicação é mais restrita – e que, por isso, permaneciam no caixa do Tesouro – para outras finalidades.
A proposta alcança o Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD), o Fundo Nacional Antidrogas (Funad), o Fundo da Marinha Mercante (FMM), o Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac), o Fundo Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (Funset), o Fundo do Exército, o Fundo Aeronáutico e o Fundo Naval.
Atualmente, o dinheiro desses fundos, quando não é gasto, ajuda a reduzir o déficit primário. Da forma como foi escrito, o texto possibilita o uso do dinheiro para três finalidades: abater a dívida pública; pagar despesas primárias, o que seria discutível; e repassar para bancos públicos, o que seria condenável.
O Ministério da Fazenda sustentou que o saldo vai ser usado para abater a dívida pública. Ao jornal Valor Econômico, a pasta justificou não haver a necessidade de explicitar essa informação no projeto de lei e disse que ela poderá ser incluída no texto ao longo da tramitação, caso os parlamentares considerem necessário – algo que, segundo o Estadão, parece evidente.
“Incluir essa informação na proposta antes de enviá-la ao Congresso teria sido uma iniciativa muito positiva e pouparia desgastes adicionais, haja vista que administrações petistas são pródigas em recorrer a medidas parafiscais para financiar políticas públicas”, diz o jornal. “Foi assim, por exemplo, que Lula, em seu segundo mandato, e Dilma Rousseff turbinaram o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.”
Para o Estadão, o fato de o governo não ter se antecipado aos mais que previsíveis questionamentos de especialistas sobre as brechas abertas pelo dispositivo mostra que a equipe econômica ainda não compreendeu que o cenário com o qual trabalhava não existe mais.
“Ao frustrar as expectativas que ele mesmo alimentou a respeito do pacote fiscal, o governo deu motivos para que o câmbio ultrapassasse a marca de R$ 6, a curva futura de juros atingisse 14% e o Ibovespa despencasse”, diz o texto.
Pacote de governo Lula provocou polêmica
O pacote tem medidas estruturais duras, entre elas mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC) que vão dificultar a concessão do auxílio a pessoas com deficiência, como apontou artigo da senadora Mara Gabrilli (PSD-SP) publicado no Estadão.
Mas o fato é que o plano ficou marcado pelo anúncio da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais, medida confirmada por ninguém menos que o ministro Fernando Haddad em cadeia nacional de rádio e TV.
“Além de representar uma renúncia de receitas relevante em um governo que diz almejar zerar o déficit fiscal, desonera uma parcela da população que muito provavelmente gastará o dinheiro em vez de poupá-lo”, avalia a publicação.
Ainda que a proposta tenha que ser aprovada pelo Legislativo para entrar em vigor, e a despeito das sinalizações do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de não haver pressa para analisá-la, é inegável que ela tem o potencial de aumentar a inflação.
Não à toa, a aposta majoritária dos investidores para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC) é de um aumento de 0,75 ponto porcentual na taxa básica de juros.
“Entender o motivo dessa reação, em vez de atribuí-la à má vontade do mercado com administrações petistas, seria muito útil no urgente trabalho de contenção da piora das expectativas”, afirma o Estadão.
A decepção gerada pelo esvaziado pacote fiscal não explica, sozinha, a queda nos preços dos ativos do mercado. Também por fatores externos, como a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, dificilmente o câmbio voltará ao patamar de R$ 4,90 do fim do ano passado, mas a cotação do dólar pode recuar a depender dos próximos passos.
“O maior risco é o de perda de credibilidade da equipe econômica, ainda menosprezado pelo governo Lula”, conclui o texto.