A criação do chamado ‘IBGE Paralelo’ tem sido o principal alvo de críticas dos funcionários desde que foi proposta pelo atual diretor
Funcionários do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicaram nesta terça-feira, 21, uma carta aberta com um pedido de “atuação urgente” do Congresso Nacional em defesa da autonomia técnico-científica da instituição. Segundo os servidores, a integridade do órgão estaria em risco diante da criação da fundação de direito privado IBGE+, proposta pelo atual presidente, Marcio Pochmann.
A carta é assinada pela Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP), que solicita medidas legislativas de parlamentares para impedir a criação desse novo órgão, que foi apelidado de “IBGE Paralelo”.
O IBGE, por sua vez, informou que a posição oficial da presidência do instituto sobre o tema permanece inalterada. Em nota divulgada em 15 de janeiro, a instituição afirma que a criação da Fundação IBGE+ é “alvo de forte campanha de desinformação” e que a iniciativa foi debatida com órgãos federais e aprovada por unanimidade pelos membros do Conselho Diretor.
A nota diz ainda que a fundação visa a “permitir a busca de recursos não orçamentários essenciais para a urgente e imprescindível modernização e fortalecimento tecnológico” do IBGE.
Servidores, inclusive de cargos-chave da gestão do instituto, têm questionado as decisões de Pochmann nos últimos meses. O sindicato tem promovido várias mobilizações de trabalhadores, até mesmo paralisações, contra o autoritarismo da gestão atual.
Um dos principais pontos de discórdia é a criação da Fundação IBGE+, uma entidade de direito privado criada em julho passado, no Rio de Janeiro, com o objetivo de captar recursos para financiar as pesquisas do instituto. Os servidores alertam para um risco institucional dessa iniciativa e dizem que não houve uma comunicação clara sobre a criação desse “IBGE Paralelo”, nem sobre a função que ele terá.
Os servidores destacam que a criação da fundação tem gerado “grande comoção social, com reflexos preocupantes na credibilidade de indicadores relevantes para a política econômica nacional e a avaliação de políticas públicas nacionais”.
IBGE está na “mais grave crise de sua história”, dizem servidores
O IBGE completou 90 anos em 2024. De acordo com a carta da CNSP, o aniversário do instituto aconteceu em meio à “mais grave crise de sua história, deflagrada a partir da constituição da Fundação de Apoio à Inovação Científica e Tecnológica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística”.
A CNSP diz ainda que o ato administrativo que criou a Fundação IBGE+ apresenta “graves inconsistências jurídicas insanáveis”, que incluem uma violação das competências exclusivas da União. Para a confederação, a fundação privada “representa a precarização às avessas dos serviços oficiais de estatística, geografia, geologia e cartografia de âmbito nacional”.
A manutenção do “IBGE Paralelo”, diz ainda a CNSP, é “inadmissível” e representaria um “extremo risco” à qualidade dos serviços oficiais do instituto. A confederação de servidores repudiou ainda as investidas da gestão de Marcio Pochmann contra o sindicato dos funcionários do IBGE, no que chamou de “ações corrosivas”, com o “propósito de intimidar e reprimir” a representação sindical.
“Diante de flagrantes abusos, a CNSP vem pedir aos congressistas a adoção de medida legislativa no sentido de sustar urgentemente o ato constitutivo da entidade privada IBGE+”, diz o comunicado, assinado por Antonio Tuccilio, presidente da confederação.
A CNSP pede ainda que o Estado brasileiro seja denunciado, por violações de direitos trabalhistas, na Organização Internacional do Trabalho (OIT), na Comissão Interamericana de Direitos Humanos e na Organização das Nações Unidas (ONU).
Servidores se preocupam com abalo na confiança da população
A crise interna no IBGE se arrasta há meses e abalou a confiança dos cidadãos na instituição. Uma carta aberta assinada por mais de 130 coordenadores, gerentes e técnicos do IBGE, divulgada na última segunda-feira, 20, afirma que a gestão de Pochmann no comando do instituto tem sido pautada por “posturas autoritárias” e “desrespeito ao corpo técnico da casa”.
Os servidores, por sua vez, defendem a qualidade e a confiabilidade dos dados produzidos pelo IBGE, ao contrário do que diz um comunicado de Pochmann publicado em 15 de janeiro. “Somos absolutamente comprometidos com a qualidade das informações estatísticas e geocientíficas que produzimos até hoje”, diz a carta. “Os dados produzidos no IBGE seguem princípios e metodologias confiáveis e internacionais.”
O presidente do IBGE, em seu comunicado, acusou os servidores de divulgarem mentiras sobre o instituto. Pochmann também sugeriu que poderia recorrer à Justiça contra as críticas, o que intensificou a insatisfação interna.
Em resposta, os servidores reafirmaram o compromisso com a qualidade do trabalho feito pelo IBGE, destacaram os quase 90 anos de serviços prestados à sociedade brasileira e manifestaram apoio aos diretores que pediram exoneração em razão de discordâncias com a gestão. “A condução do IBGE com viés autoritário, político e midiático pela gestão Pochmann é a verdadeira causa da crise em que se encontra a instituição”, diz a carta aberta.
Os servidores exigem a suspensão imediata das atividades da Fundação IBGE+ e a abertura de debates internos sobre o futuro da entidade. A gestão Pochmann, dizem eles, ameaça seriamente a missão institucional e os princípios orientadores do IBGE. “O clima organizacional está deteriorado e as lideranças encontram sérias dificuldades para desempenhar suas funções.”