Crescem as expectativas de novos embates entre Moraes e o flanco minoritário do STF

Eles formam um trio heterogêneo e minoritário no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), mas concentram a expectativa da oposição e dos simpatizantes de Jair Bolsonaro (PL) de que ainda possa surgir resistência no julgamento contra o ex-presidente Jair Bolsonaro.

André Mendonça, Kassio Nunes Marques e Luiz Fux são os únicos ministros a apontar divergências em processos conduzidos pelo relator, Alexandre de Moraes, cuja linha severíssima tem pautado a condenação de centenas de réus do 8 de janeiro e de outros processos correlatos. Novos embates virão.

Durante a sessão do julgamento de Bolsonaro desta terça-feira (9), Fux, único do flanco minoritário da Corte na Primeira Turma, interrompeu o relator Moraes para anunciar que levará ao plenário do colegiado um debate sobre pontos do processo nos quais sabidamente tem divergido.

Moraes analisava contestações das defesas de Bolsonaro e dos outros sete réus quando Fux sinalizou embate. Ele disse que, em seu voto, retomará pontos já rejeitados e que não aceitará interrupções. “Desde o recebimento da denúncia, ressalvei minha posição. Embora vote diretamente no mérito, abordarei questões preliminares”, referindo-se a debates como se o STF ou a primeira instância deveriam julgar o caso ou a validade do depoimento do delator, Mauro Cid.

Fux já contestou penas, delação de Cid e foro do STF para julgar Bolsonaro

A postura de Fux era esperada. Ele já contestou a competência do STF para julgar o caso, considerou “exacerbadas” as penas impostas a réus do 8 de janeiro, votou contra as medidas cautelares a Bolsonaro e questionou a instável delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente.

Após a intervenção de Fux, Moraes frisou que todas as preliminares foram rejeitadas por unanimidade e que não houve fato novo. Ele reiterou a validade do processo, negou cerceamento de defesa, falha da denúncia e falta de justa causa e ainda manteve a delação de Cid como prova válida.

Referência para as defesas, que usam seus argumentos como base para pedidos de absolvição, Fux tem sido foco da atenção de apoiadores de Bolsonaro. Os aliados do ex-presidente acreditam que o ministro possa retardar o julgamento da suposta trama golpista com um pedido vista do processo – o que pode adiar a decisão por até 90 dias.

Apesar disso, ele tem sinalizado que não pedirá vista, eliminando a possibilidade de adiamento da conclusão do julgamento. Com isso, o julgamento deve seguir sem interrupções, reduzindo as chances de reviravolta estratégica a favor de Bolsonaro e dos demais réus da Primeira Turma.

Para jurista, dissidências internas na Corte serão esmagadas pela maioria

Políticos, juristas e o público conservador esperam que os magistrados, em dissidências, abram brechas capazes de induzir revisões ou ao menos endossar questionamentos sobre as ausências do devido processo legal e da garantia da defesa. A condenação de Bolsonaro a uma longa prisão é dada como certa.

Para a professora constitucionalista Vera Chemim, as divergências de uma minoria no STF sobre os inquéritos e a ação penal contra Bolsonaro revelam questionamentos internos sobre uma constante mudança de jurisprudência da Corte, movida por conveniências e por sua crescente politização.

“As vozes isoladas expõem a insegurança jurídica e a instabilidade política geradas por interpretações voláteis da Constituição. Embora vencidas pela maioria, elas podem influenciar revisões processuais e legislativas e até resgatar a credibilidade do STF. Até lá, as posições da minoria serão esmagadas”, diz.

Futuro presidente do STF a partir de 29 de setembro, Edson Fachin revelou em raro discurso feito mês passado o temor de escalada de protestos contra a Corte. “Vivemos tempo de apreensão. Temos o dever de dar efetividade a compromissos assumidos pelo país”, disse.

Magistrados divergentes não devem ser sancionados pelos EUA

Dos 11 membros da Corte, os divergentes podem ser os únicos que irão escapar da revogação de vistos imposta pelos Estados Unidos em 18 de julho, dentro do contexto da crise diplomática e comercial bilateral. Posteriormente, Moraes foi incluído na lista de sanções da Lei Magnitsky Global, que impõe restrições financeiras e patrimoniais a violadores de direitos humanos.

Diferentes em origem e trajetória, Mendonça e Nunes Marques chegaram ao STF por indicação de Bolsonaro. Já Fux, indicado por Dilma Rousseff (PT), é juiz de carreira. A despeito das diferenças, eles passaram a ser vistos como “luzes no fim do túnel” por advogados que apontam abusos processuais.

Tensões entre a ala divergente do STF e os demais se tornaram públicas

As tensões entre as duas “alas” do STF já se tornaram públicas. Em 14 de agosto, Fux confrontou o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, por perder a relatoria de um caso após ser vencido parcialmente. “Vossa Excelência não está sendo fiel aos fatos”, retrucou Barroso.

Houve atritos entre Mendonça e Moraes em plenário. Mas o maior embate público ocorreu em 22 de agosto, no Fórum Lide, no Rio, quando Mendonça frisou que “juiz tem de ser respeitado e não temido”, frase reproduzida pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) no ato do 7 de Setembro.

No ato pró-anistia na Avenida Paulista, em 6 de abril, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro apelou a Fux. “Sei que o senhor é juiz de carreira e não vai jogar o seu nome na lama”, disse. Desde maio de 2024, Fux é relator no STF do recurso de Bolsonaro contra decisão do TSE que o tornou inelegível.

Postura de Zanin serve a especulações sobre julgamento de Bolsonaro

Chamado nos bastidores de “garantista”, Cristiano Zanin, ex-advogado de Lula e presidente da Primeira Turma, divergiu, assim como Fux, sobre a extensão de penas dadas a réus do 8 de janeiro por Moraes. Ele adotou posição mais flexível, embora corrobore o processo com autonomia técnica.

O cientista político Ismael Almeida observa que há chance remota de o caso de Bolsonaro ir ao plenário, via recurso da defesa, onde seria julgado por todos os ministros e não por apenas cinco. “Mendonça já analisa habeas corpus de réu de outro núcleo, em alegações finais. Mas, mesmo que conceda suspensão, isso não afeta o grupo de réus com o ex-presidente”.

Nesse cenário, as atenções recaem sobre Fux. Um voto contrário dele à condenação só teria efeito se obtivesse ao menos mais um apoio na Turma. Especula-se sobre a adesão de Zanin, hipótese que Almeida rechaça. “O veredicto está dado. Resta acompanhar o desdobramento político”, resume.

Crédito Gazeta do Povo

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