Foto - Gustavo Moreno/AP
Profissionais do portal UOL e do jornal O Globo tentam associar imagem do ditador venezuelano com espectro político fora da esquerda
A imprensa brasileira tem mudado seu discurso sobre o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, ser um político “progressista de esquerda”. A transformação no tratamento se deu depois de o chavista questionar o sistema eleitoral brasileiro durante um comício na noite desta terça-feira, 23, no Estado de Aragua.
Na ocasião, Maduro exaltou o sistema eleitoral venezuelano, o qual, segundo ele, realiza 16 auditorias, incluindo uma em tempo real, em 54% das urnas. Nesse sentido, desafiou o modelo de outros países.
“Em que outra parte do mundo fazem isso?”, indagou Maduro. “Nos Estados Unidos? O sistema eleitoral é auditável? No Brasil? Não auditam nem uma ata. Na Colômbia? Não auditam nem uma ata.”
Bastou o ditador da Venezuela reclamar do sistema eleitoral brasileiro para que parte da imprensa tradicional iniciasse uma série de críticas. A mídia começou a tratar Maduro, agora, como um político de “extrema direita”. O chavista chega a ser comparado ao ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL).
Nesta quarta-feira, 24, a colunista de política e economia do portal UOL Raquel Landim publicou um artigo com a seguinte chamada: “É inadmissível tolerar fala bolsonarista de Maduro sobre eleições no Brasil”.
“Maduro disse que as urnas brasileiras não são auditáveis, dando margem a questionamentos sobre os resultados das eleições”, escreveu a jornalista. “É exatamente o mesmo argumento usado pelos bolsonaristas.”
O artigo repercutiu nas redes sociais. Entretanto, não com críticas positivas. Políticos de direita questionaram o argumento apresentado por Raquel Landim. Bolsonaro, por sua vez, tomou um tom mais irônico: “Maduro is my friend kkkkkkkk”.
Imprensa segue comparando Maduro à “extrema direita”
O jornal O Globo também foi na mesma linha de comparação. A reportagem “Maduro adota discurso da extrema-direita e diz que sistema eleitoral do Brasil não é auditável” afirma que o chavista, “em uma escalada retórica” com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, fez uma declaração sobre nosso sistema eleitoral que é “largamente rebatido pelas instituições brasileiras”.
Até mesmo o site O Antagonista entrou na onda da imprensa tradicional: “Maduro adere à narrativa bolsonarista sobre urnas brasileiras”.
Reinaldo de Azevedo, âncora na BandNews TV e colunista do UOL, fez um vídeo detalhando o porquê Nicolás Maduro — a partir de agora — adota um discurso “bolsonarista”.
“Atenção, esquerdas brasileiras”, iniciou Azevedo. “Tá aí, o senhor Nicolás Maduro agora está repetindo, sobre as eleições brasileiras, aquilo que diz Jair Bolsonaro.”
Políticos de esquerda já contestaram urnas eletrônicas
Apesar de parte da imprensa brasileira tentar associar Maduro à “extrema direita” em razão de críticas às urnas eletrônicas do país, políticos de esquerda já adotaram postura similiar.
Leonel Brizola, liderança histórica do PDT, chegou a contestar o sistema de apuração eletrônica quando perdeu as eleições pela Prefeitura do Rio de Janeiro em 2000. Ao ter só 9% das intenções de voto no primeiro turno, ele afirmou ao jornal Folha de S.Paulo que o país tinha perdido “o direito à recontagem”.
O atual presidente nacional do PDT e ministro da Previdência, Carlos Lupi, também já defendeu o retorno do voto impresso no país. Pelas redes sociais, divulgou um vídeo em fevereiro de 2022 em que fala que a posição do partido é a mesma “há mais de 20 anos”.
“A urna eletrônica deveria ter a impressão do voto do lado, com uma impressora, com uma tela transparente, para se conferir o voto e depois ir para a urna”, afirmou Lupi à época.
O ex-ministro da Justiça e atual integrante do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, também já duvidou das urnas eletrônicas, como mostrou reportagem especial de Oeste.
Em 2013, quando era presidente da Embratur e já pensava em se candidatar ao cargo de governador do Maranhão, Dino tuitou: “Hoje, em Recife [sic], vi a comprovação científica de que as urnas eletrônicas são extremamente inseguras e suscetíveis a fraudes”.