Enquanto aguardam as novas sanções de Washington em resposta à condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) podem ter uma certeza: é melhor trocar os congressos e fóruns em solo americano por eventos no Brasil.
As medidas restritivas que devem ser anunciadas pelo presidente Donald Trump podem atingir não apenas os magistrados da Primeira Turma, que participaram do julgamento encerrado no dia 11 de setembro, mas a maioria da corte.
E, desde já, a rotina dos integrantes da corte mudou.
O atual presidente do tribunal, Luís Roberto Barroso, por exemplo, não vai comparecer presencialmente à edição 2025 do Seminário Constitucionalismo Global, promovido anualmente pela Faculdade de Direito da Universidade de Yale. A ida do ministro ao encontro na edição de 2024 foi destaque no site do Supremo. Na ocasião, Barroso proferiu uma palestra que recebeu o título de “Julgando em Tempos de Crise”.
Se confirmada a participação online, será a primeira vez em mais de uma década em que Barroso não estará presente no encontro, descrito pela Universidade de Yale como “um fórum onde alguns dos mais renomados juristas do mundo podem discutir, de forma confidencial e livre, as questões jurídicas mais importantes do momento com destacados acadêmicos do direito”.
Em julho deste ano, o governo americano anunciou a retirada do visto de Alexandre de Moraes e de seus “aliados” no STF. O comunicado não deixa claro quais ministros foram atingidos. Segundo a coluna Radar, da revista VEJA, o presidente do STF não foi informado oficialmente sobre a suspensão do seu visto. Mas há poucas dúvidas de que, se Moraes não foi o único ministro do Supremo afetado, Barroso está na lista.
Barroso participou de série de eventos nos EUA em 2024
Barroso costuma viajar com frequência aos Estados Unidos.
Além do seminário em Yale, o presidente do STF participou recentemente do Pacto Global da ONU, em Nova York, e no Summit of the Future, que tratou de assuntos como o futuro da governança global. Ambos os eventos aconteceram em outubro do ano passado, e foram tema de uma nota orgulhosa no site do STF.
Na mesma visita ao território americano, Barroso esteve na Costa Oeste. Na Universidade de Stanford, na Califórnia, ele tomou parte em um encontro promovido pelo Deliberative Democracy Lab. Lá, o ministro falou sobre as características que, na avaliação dele, diferenciam o STF de outras cortes constitucionais do mundo.
Em maio deste ano, ele voltou aos Estados Unidos e participou da Brazilian Week, uma série de eventos de debates e encontros entre autoridades dos três poderes e potenciais investidores estrangeiros.
Na edição de 2025, em Nova York, Barroso contou com a companhia do Procurador-geral da República, Paulo Gonet, e do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Ministro classificou STF como “modelo brilhante do constitucionalismo”
Além da defesa do “tribunal em tempos turbulentos” e da responsabilidade do judiciário em preservar a “democracia”, Barroso costuma falar sobre a adoção de novas tecnologias pelo judiciário e a “preocupação com o populismo”. Foi o caso da sua participação no evento “Democracia, Populismo e Resistência Institucional: os Tribunais Supremos no Jogo do Poder”, na Universidade de Princeton, em janeiro de 2025.
À época, o palestrante ainda tratava o julgamento de Bolsonaro como uma possibilidade futura. Na ocasião, Barroso classificou o STF como “líder na regulamentação de plataformas de mídia social, IA e desinformação, e defensor do meio ambiente e dos direitos sociais”, além de ser “um dos modelos brilhantes do ‘Constitucionalismo do Sul Global’”.
“Quando Bolsonaro ameaçou a integridade do sistema eleitoral, o Tribunal Eleitoral (composto por um subconjunto de juízes do Supremo Tribunal Federal) manteve a linha e garantiu que o Brasil pudesse ter uma eleição livre e justa. Quando Bolsonaro perdeu a eleição e seus apoiadores invadiram o Tribunal, o Congresso e o Palácio do Planalto, o STF o desqualificou de concorrer à presidência novamente por oito anos”, aponta a página do evento.
Brazilian Conference, em Harvard, sem ministros do STF?
Outro que deve diminuir suas participações presenciais em eventos nos EUA é o ministro Gilmar Mendes. Ele esteve em abril de 2025 na Brazilian Conference, organizada anualmente pela Universidade de Harvard. Na ocasião – quando dividiu o palco com outros participantes tão diversos como Ana Maria Braga, Sabrina Sato, Jorge Paulo Lemman e Tabata Amaral (PSB-SP) – o decano do STF tratou de diversos assuntos.
Além de Mendes, outros participantes frequentes da Brazilian Conference de Harvard são os ministros Luís Roberto Barroso, que esteve por lá em 2024, 2023 e 2019; Luiz Fux, que compareceu quando era presidente do STF, em 2021; Dias Toffoli, palestrante em 2019; e Alexandre de Moraes, que apresentou painéis em edições anteriores.
Em uma entrevista durante o encontro mais recente, Mendes afirmou que o Brasil aprendeu muito com os norte-americanos, como o controle de constitucionalidade e o recurso extraordinário. No entanto, também avançou, dando respostas “muito efetivas” aos atos de 8 de janeiro, em contraste com o 6 de janeiro nos EUA, punindo os responsáveis e aplicando leis contra crimes ao Estado Democrático. Ele destacou ainda o papel da justiça eleitoral brasileira, que não só organiza eleições, mas também julga abusos, oferecendo uma “pletora de instituições” ao mundo.