CPMI quer questionar Messias sobre sindicato do irmão de Lula antes da sabatina para o STF

A indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias, para o Supremo Tribunal Federal (STF), anunciada nesta quinta-feira (20), mudou o clima na CPMI do INSS. Integrantes do colegiado agora se veem mais empenhados em questionar o indicado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva por uma suposta omissão da AGU no caso dos descontos associativos irregulares.

Parlamentares da CPMI dizem que Messias ignorou alertas internos e demorou a agir contra entidades suspeitas — entre elas o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), dirigido por Frei Chico, irmão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A CPMI quer questionar Messias diretamente sobre isso antes de sua sabatina no Senado, passo necessário para ser nomeado para o STF. Messias foi indicado por Lula a contragosto do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP) e, por isso, pode ter dificuldades para ter o nome aprovado.

Em setembro deste ano, a AGU pediu à Justiça o bloqueio de cerca de R$ 3 bilhões em bens de 12 entidades associativas e três empresas investigadas por descontos ilegais em benefícios do INSS. Entre os alvos está o Sindnapi-FS, do irmão de Lula.

Mas a medida ocorreu um ano e cinco meses após procuradores da própria AGU terem identificado que o sindicato estava entre as entidades com aumento expressivo de queixas judiciais e recomendado medidas para suspensão de convênios.

O tema ganhou forte repercussão entre os integrantes da CPMI. A oposição afirma que o atraso nas medidas reforçaria uma “blindagem” ao sindicato ligado ao irmão do presidente.

De acordo com o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), “o governo Lula foi alertado sobre o roubo aos aposentados, mas escolheu cruzar os braços”.  “Jorge Messias ignorou documentos da própria AGU e blindou entidades amigas do PT enquanto os velhinhos eram saqueados. Acionamos PGR, TCU e Comissão de Ética porque quem prevarica precisa responder”, afirmou.

O deputado federal Evair de Melo (PP-ES) disse que Messias “ignorou alertas internos por razões políticas”. “A AGU diluiu o alerta sobre associações, inclusive sobre o sindicato do irmão do Lula. Agora tenta corrigir um ano depois”, declarou. 

Já o deputado federal Luiz Lima (PL-RJ) citou a repercussão na imprensa nacional e classificou o caso como “segunda bomba” envolvendo a atuação da AGU. “Há fortíssimas evidências de que o alerta foi ignorado. O Sindnapi estava em um processo interno da AGU desde o início de 2024”, completou.

O senador Eduardo Girão (Novo-CE) informou que Messias deverá ser ouvido na CPMI antes da sabatina. Para ele, a indicação do AGU é “totalmente ideológica”. “Basta de amigo de presidente dentro do STF. Messias precisa ser ouvido antes da sabatina. Ele sabia da fraude e não agiu. Tem de explicar isso primeiro à CPMI”, disse à Gazeta do Povo.

A AGU nega omissão e diz que só incluiu entidades no primeiro pedido de bloqueio quando havia indícios concretos apontados pela CGU e pela PF, como pagamento de propina e atuação de fachada.

Segundo o órgão, o Sindnapi não aparecia nesses elementos iniciais e só passou a ser alvo após a abertura de 40 novos Processos Administrativos de Responsabilização (PARs) pela CGU, o que motivou novas ações judiciais. A AGU também afirma já ter obtido decisões de bloqueio que somam R$ 2,8 bilhões. Confira a nota da AGU na íntegra no fim da matéria.

Relator da CPMI cita “falha grave” da AGU

O relator da CPMI, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), afirma que os novos documentos reforçam a hipótese de “falha grave” por parte da AGU. “Não há dúvida de que houve omissão generalizada do Estado”, afirmou.

De acordo com Gaspar, “a AGU tinha informação desde abril de 2024, mas só se mexeu um ano depois”. “Foi morosidade? Ou intenção de proteger associações como o Sindnapi, que tem o irmão do presidente da República como vice-presidente? Isso precisa ser esclarecido”, reforçou o relator.  

Para o relator, a própria AGU deveria se antecipar e prestar esclarecimentos sobre o fato na CPMI. “Seria do interesse da AGU vir aqui explicar tudo. Com o grau de respeitabilidade que tem, deveria se colocar à disposição”, disse. 

O colegiado já aprovou convite para que Jorge Messias compareça à CPMI. A audiência ainda depende do agendamento de data por parte da CPMI do INSS. Por se tratar de convite, Messias poderá decidir se vai ou não à comissão.

No requerimento, apresentado por Kim Kataguiri (União-SP), além de outros deputados, consta o pedido para que Messias explique os critérios usados para excluir entidades das primeiras ações cautelares e a demora em agir contra entidades que já haviam sido identificadas por procuradores da própria AGU. Kataguiri ressaltou que o avanço do processo contra o sindicato aumenta a chance de Messias ser convocado e que o caso expõe uma omissão deliberada.

A CPMI também quer explicações sobre os termos e efeitos do Acordo Interinstitucional homologado pelo STF na ADPF 1236, que, segundo os parlamentares, pode ter influenciado o comportamento da AGU no caso dos descontos indevidos.

O acordo, firmado entre AGU, INSS, CGU, MPF, DPU e OAB, criou um regime especial para ressarcir aposentados vítimas de descontos associativos irregulares, suspendendo ações judiciais e centralizando a reparação administrativa.

Na avaliação de membros da CPMI, essa solução negociada — que definiu que a União arcaria com a devolução dos valores entre 2020 e 2025 antes mesmo da responsabilização completa das entidades — pode ter levado a AGU a adotar uma postura mais cautelosa, seletiva ou lenta na escolha das associações incluídas nas primeiras ações cautelares.

O temor dos parlamentares é de que o acordo tenha funcionado, na prática, como um “amortecedor institucional”, reduzindo o ímpeto de atuação imediata contra algumas entidades, entre elas o sindicato ligado ao irmão do presidente.

Fato pode fragilizar Messias em sabatina

Para especialistas, o caso combina três elementos sensíveis: demora na adoção de medidas, proximidade do sindicato com Lula e o fato de o chefe da AGU disputar uma vaga na mais alta Corte do país.

Segundo o cientista político Juan Carlos de Arruda, diretor-geral do Ranking Político, a situação abre espaço para leituras políticas inevitáveis. “Quando há demora numa medida que envolve um sindicato ligado a parente do presidente, a percepção pública tende a enxergar proteção. E, nessa situação, percepção pesa tanto quanto fato”, afirma.

A avaliação é de que esse ruído pode fragilizar Messias justamente no momento em que ele dependerá da confiança dos senadores. “Cada episódio de possível leniência fragiliza a narrativa de independência de Jorge Messias e dá munição para cobranças durante a sabatina”, diz Arruda.

No Senado, o temor de “dois pesos e duas medidas” é particularmente sensível. Arruda explica que, em temas envolvendo aliados do governo, a oposição costuma explorar qualquer aparente seletividade. “A sabatina do STF virou um momento de ajuste de contas. Se os senadores entenderem que houve seletividade ou blindagem, o desgaste não recai apenas sobre a AGU, mas sobre o próprio Planalto.”

O cientista aponta que a estratégia da oposição é salientar a existência de alertas internos, o intervalo de um ano até a adoção de medidas concretas e a ligação do Sindnapi-FS com o irmão do presidente. “O timing das ações e a proximidade dos envolvidos fornecem combustível narrativo. A oposição está claramente explorando isso para chegar à sabatina com o governo na defensiva”, afirma Arruda.

Se a CPMI entender que houve retardamento deliberado, isso pode reduzir o apoio à indicação para o STF e aumentar a pressão para que Messias esclareça o caso antes da sabatina no Senado. “É muito mais um risco político do que jurídico. Mas é um risco político suficiente para atrapalhar a aprovação do nome dele no Senado”, diz o cientista político.

O que dizia o alerta interno ignorado

O levantamento que apontou o Sindnapi-FS como uma das “principais entidades” com suspeita de fraude surgiu no âmbito de um processo administrativo aberto pela AGU na 4ª Região (PR, SC e RS). Procuradores relataram a explosão de ações judiciais envolvendo o INSS e identificaram nove entidades com aumento significativo de reclamações por descontos associativos não autorizados.

Embora originado regionalmente, o alerta chegou rapidamente à cúpula em Brasília:

  • 30 de agosto de 2024: o corregedor-geral da AGU, Heráclio Mendes de Camargo Neto, toma conhecimento do levantamento.
  • 3 de setembro de 2024: o documento é formalmente enviado ao ministro Jorge Messias.
  • 15 de outubro de 2024: o relatório é aprovado pelo procurador Flávio José Roman, como Advogado-Geral da União substituto.

A AGU diz que a assinatura por um substituto é procedimento normal.

O alerta surgiu durante uma correição — fiscalização periódica destinada a avaliar produtividade e eficácia — em uma equipe de 63 procuradores no Sul. As demandas do INSS apareciam como um dos pontos críticos. Em reunião de 22 de abril de 2024, procuradores avisaram a corregedoria que o volume de ações sobre consignados e descontos associativos exigia “revisão do tema”.

O processo administrativo aberto a partir dessa fiscalização revelou aumento expressivo de ações contra entidades de aposentados; comunicação formal à direção do INSS pedindo “providências cabíveis para suspensão dos convênios”; comparação com casos semelhantes de 2019, quando convênios haviam sido encerrados após suspeitas de fraude; tratativas junto ao Judiciário para mapear estoques de processos e apuração de irregularidades.

Apesar disso, a AGU afirmou posteriormente que o trabalho dos procuradores regionais não apresentava “elementos suficientes” para embasar uma ação judicial.

Por que o Sindnapi só entrou na ação em setembro

Mesmo estando no mapeamento interno desde abril de 2024 e apesar das comunicações encaminhadas ao INSS e ao Judiciário, o Sindnapi-FS não foi incluído entre as primeiras 12 entidades processadas pela AGU em maio deste ano.

A inclusão só ocorreu na nova ação ajuizada em setembro. A AGU diz que as medidas são vinculadas exclusivamente aos Processos Administrativos de Responsabilização (PARs) instaurados pela CGU — e que somente em setembro esses novos PARs foram formalmente abertos.

“Com a instauração desses novos PARs, a AGU passou a analisar, com prioridade e em coordenação com a Controladoria, a adoção de novas medidas judiciais para o bloqueio cautelar de bens e valores”, afirmou a pasta.

TCU pediu explicações à AGU sobre atuação no caso das entidades associativas

A atuação da AGU no caso das fraudes bilionárias contra aposentados e pensionistas virou alvo de questionamento no Tribunal de Contas da União (TCU). O caso veio à tona, após uma acusação do deputado André Fernandes (PL-CE), de que o órgão estaria “blindando” entidades investigadas, como o Sindnapi. 

Segundo o parlamentar, a AGU deveria ter incluído dezenas de associações em pedidos de bloqueio de bens, mas optou por acionar judicialmente apenas 12. A denúncia foi formalizada em 3 de junho, em representação ao TCU, e ganhou força na CPMI do INSS, que investiga os esquemas de descontos irregulares sobre benefícios previdenciários.

No despacho sobre a representação, o ministro Aroldo Cedraz reconheceu a admissibilidade do pedido e destacou a gravidade do caso, que envolve R$ 6,3 bilhões em fraudes entre 2019 e 2024. Ele, no entanto, indeferiu a medida cautelar solicitada por Fernandes, entendendo que ainda não estavam presentes todos os requisitos legais para ampliar a indisponibilidade de bens.

Apesar disso, Cedraz determinou que a AGU prestasse explicações detalhadas sobre os critérios utilizados para incluir ou excluir entidades das ações cautelares, bem como informações sobre o valor efetivamente bloqueado até agora e medidas em andamento para ressarcir aposentados e pensionistas. O ministro também intimou o INSS a apresentar um plano de devolução dos valores cobrados de forma irregular.

Na resposta enviada ao TCU, a AGU alegou que só pediu bloqueios contra 12 entidades porque havia “substrato documental consistente” em relação a elas, com base nos Processos Administrativos de Responsabilização (PARs) instaurados pelo INSS e depois assumidos pela Controladoria-Geral da União (CGU). Sem a existência formal desses processos, sustentou a AGU, não seria possível pedir medidas judiciais.

O que diz a AGU sobre alerta ignorado

Ao ser questionado sobre possível omissão e blindagem da AGU ao sindicato do irmão de Lula, o órgão informou que a inclusão das entidades no primeiro pedido cautelar dependeu de indícios concretos identificados pela CGU e pela PF — especialmente pagamento de propina e caráter de fachada. 

Segundo a AGU, o Sindnapi não constava nos elementos iniciais repassados pela CGU e os novos pedidos de bloqueio decorrem da abertura de 40 novos Processos Administrativos de Responsabilização (PARs) pela CGU no início do mês. Após a abertura dos novos PARs, uma equipe especial da AGU passou a “analisar, com prioridade” a adoção de novas ações judiciais.

O órgão afirma ainda que já conseguiu decisões de bloqueio que somam R$ 2,8 bilhões, envolvendo veículos, imóveis e valores de contas de consultorias, sindicatos e dirigentes.

Confira a nota da AGU na íntegra

“Tão logo concluiu o Relatório de Correição nº 033/2024, a Advocacia-Geral da União (AGU) encaminhou as conclusões do trabalho à Direção do INSS. O documento registra de forma expressa que a equipe técnica da AGU requereu à Direção do Instituto “providências cabíveis para suspensão dos convênios junto ao INSS”. Essa recomendação foi encaminhada ao INSS por meio do DESPACHO nº 00002/2024/NIJ-ADM/EADM4/PGF/AGU.

Cabe esclarecer que o Relatório de Correição decorreu de um procedimento rotineiro conduzido pela Corregedoria-Geral da AGU, nesse caso, realizado em uma unidade de atuação contenciosa da Procuradoria-Geral Federal (PGF/AGU).

Esse procedimento teve como objeto a avaliação da gestão de processos de trabalho e da inteligência jurídico-processual, com foco na verificação da regularidade e da eficácia dos serviços jurídicos prestados pela unidade que foi objeto da correição.

O trabalho não identificou fraudes nos descontos associativos nem trouxe elementos que justificassem atuação investigativa ou corretiva por parte da AGU quanto [a] esse tema, pois esse não é o escopo de uma correição ordinária.

O relatório não tratou, portanto, de indícios de fraude, ilícitos ou irregularidades em benefícios do INSS. Diferentemente, identificou uma boa prática administrativa. O relatório evidenciou que a equipe técnica da AGU (EADM4) foi cuidadosa ao analisar a evolução da litigiosidade no tema, identificando o crescimento atípico de ações relacionadas a descontos associativos supostamente irregulares em benefícios do RGPS.

Esse monitoramento cumpriu exatamente o seu propósito, tanto que, como mencionado, suas conclusões foram encaminhadas à Direção do INSS. O documento desencadeou uma sequência de ações da equipe técnica da AGU junto à Direção Central do INSS e ao Poder Judiciário. Em diversos comunicados administrativos e reuniões foram tratados temas relativos à possível existência de prática de advocacia predatória e de medidas necessárias à melhoria da defesa jurídica do Instituto.

Cabe lembrar, ainda, que a AGU não detém atribuições de polícia judiciária ou de controladoria administrativa, mas de representação judicial/extrajudicial, consultoria e assessoramento jurídico da Administração Pública Federal.

A escolha das entidades associativas objeto das primeiras ações cautelares ajuizadas em maio deste ano teve como base a apuração administrativa instaurada no mesmo mês pelo INSS, considerando a existência de material probatório robusto da prática de atos de corrupção, conforme os critérios definidos pela Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção – LAC), em especial: entidades de fachada com uso de “laranjas” (art. 5º, III, da LAC) e empresas que foram usadas para pagamento de propina a agentes públicos (Art. 5º, I, da LAC). Também foram incluídas na ação seis empresas suspeitas de intermediar o pagamento de vantagens indevidas a servidores públicos.

Na ocasião, foram selecionadas as entidades que já respondiam a Processos Administrativos de Responsabilização (PARs), que estavam sob apuração da Controladoria-Geral da União (CGU), e possuíam forte indícios de terem sido criadas com o único propósito de praticar a fraude com uso de “laranjas”. Ao ajuizar as primeiras ações, a AGU atendeu a pedidos do INSS e da CGU. Elas tiveram como alvo, portanto, 12 entidades associativas, seis consultorias, dois escritórios de advocacia e três empresas.
No início de setembro deste ano, a CGU instaurou outros 40 PARs contra 38 associações e 3 empresas. A Controladoria identificou um conjunto de indícios de condutas praticadas pelas associações, que pode também ser enquadrado na Lei Anticorrupção – LAC, pela fraude no INSS (art. 5º, incisos I e V).

Com a instauração desses novos processos administrativos pela CGU, a AGU passou a analisar, com prioridade e em coordenação com a Controladoria, a adoção de novas medidas judiciais para o bloqueio cautelar de bens e valores das associações e indivíduos envolvidos na fraude. Como consequência dessa análise, ainda em setembro, a AGU ajuizou um novo lote de ações cautelares contra outras 12 entidades associativas e três empresas de tecnologia, entre eles o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical (Sindnapi).

Essas ações tramitam em sigilo na 7ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal e buscam a obtenção do bloqueio patrimonial e da quebra dos sigilos fiscal e bancário das entidades, das empresas e de seus dirigentes. Com base nas informações prestadas pela CGU, a AGU mostra nas ações uma lista de irregularidades praticadas pelas entidades associativas contra aposentados e pensionistas, tais como a realização de descontos indevidos, o envio ao INSS de documentação fraudulenta, o descumprimento de regras técnicas e a falsificação de dados”.

Crédito Gazeta do Povo

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