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ESTADÃO: ‘Exército do WhatsApp’ do Instituto Lula mantém política de disseminação de mensagens pró-governo

Mesmo após o pleito de 2022, inúmeros grupos no WhastApp continuam sendo usados para promover notícias favoráveis ao governo, conteúdos de influenciadores governistas e desinformação.

Leia matéria na íntegra:

Estratégia de comunicação petista passa, desde a campanha de 2022, pelo instituto que foi alvo da Lava Jato e que hoje mantém protagonismo no fornecimento de mensagens favoráveis ao presidente; entidade diz que canais são tocados por voluntários.

BRASÍLIA – Fora dos holofotes desde o fim da Operação Lava Jato, o Instituto Lula articulou, durante a campanha eleitoral de 2022, um exército de cerca de 100 mil militantes para propagar pelo WhatsApp mensagens eleitorais a favor de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e contra o então presidente Jair Bolsonaro (PL). Mesmo após a vitória petista, inúmeros grupos do aplicativo continuam sendo usados para liberar informações pró-governo, dar vazão a conteúdos de influenciadores governistas e desinformação.

Movimentação de grupos incentivados e mantidos pelo Instituto Lula desde a campanha de 2022 e que serão usados na disputa de 2024
 Foto: Reprodução

O plano inicial foi concebido pelo ex-sindicalista Paulo Okamotto, à época presidente do instituto e um dos coordenadores da campanha presidencial de Lula em 2022. A operação contou com a orientação de estrategistas da equipe do americano Bernie Sanders, senador independente, com propostas mais alinhadas aos democratas. Hoje, a equipe do ministro Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação da Presidência da República, e assessores da pasta usam os grupos para distribuir informações.

Em entrevista ao Estadão, Okamotto alega que o instituto é “apartidário” e não atuou na campanha presidencial passada. Segundo ele, os grupos de WhatsApp eram uma questão dos voluntários. Atual diretora da entidade, Ana Flávia Marques também defende que todo o trabalho feito nos grupos de mensagem não tem relação formal com o Instituto Lula.

O objetivo de Okamotto em 2022 era “fortalecer a presença” lulista no WhatsApp e “combater fake news”. Contraditoriamente, a estratégia usou como referência o êxito da comunicação bolsonarista e da extrema-direita mundial. Para tanto, a opção foi pela “organização em camadas”: um fala para dez, que falam para cem, que falam para mil, e assim por diante.

O Estadão revelou nesta semana que integrantes do Palácio do Planalto despacham diariamente com integrantes do ‘gabinete da ousadia’ – a réplica petista do ´gabinete do ódio´ do governo Jair Bolsonaro – para pautar redes e influenciadores governistas. Influenciadores governistas como Thiago dos Reis têm usado a mesma receita de sucesso dos bolsonaristas: vídeos publicados misturam desinformação e agressividade contra adversários políticos.

‘Programa de voluntários’

Batizado internamente de “programa de voluntários”, o mecanismo criado pelo Instituto Lula interagia com a campanha oficial para seleção de temas e abordagens, e aparecia para a militância como “Zap do Lula”, “Time Lula”, “Evangélicos com Lula” e “Caçadores de Fake News”. O caminho para acesso aos grupos continua sendo o site oficial de Lula , que segue recebendo militantes e servindo para usar o WhatsApp como um canal de distribuição de versões sobre a atuação do governo na crise do Rio Grande do Sul, por exemplo.

Toda a coordenação da presença no WhatsApp, durante a campanha, era institucional e seguia critérios técnicos e políticos. A operacionalização ficou a cargo de Ana Flávia Marques, diretora do Instituto Lula. Especialista em comunicação digital, ela coordenou a comunicação da campanha Lula Livre, de 2018 a 2021, e fez parte da coordenação digital da campanha de Fernando Haddad à presidência, em 2018.

“A gente falava: nosso grupo de ‘zap’ era a nossa sede. E a gente fez várias sedes”, disse em um treinamento para a militância petista com vistas às eleições de 2024, no fim do ano passado, ao qual a reportagem teve acesso.

Ana Flávia Marques foi uma das prestadoras de serviço oficiais da campanha e fez o trabalho sem receber por ele.

“A gente estuda o bolsonarismo há muito tempo. A gente tinha esse ‘case’ da ultra direita não só aqui no Brasil, como em outros lugares do mundo. E todos tinham essa organização em comum, a organização em camadas. Tem gente que acha impossível. Comece e vá nessa estratégia: um fala para dez. Organize esses dez, que falam para cem, que falam para mil. Vão repetindo a sua mensagem e dando coesão. Essa metodologia funcionou bastante na campanha do Lula e chegamos a quase 100 mil voluntários”, explicou aos militantes.

Um dos focos do exército de “voluntários” era reverter o apoio a Jair Bolsonaro no segmento evangélico, onde Lula tinha clara desvantagem. Entre as peças compartilhadas havia o “Evangelho segundo Bolsonaro”. Eram vídeos curtos com declarações do então presidente editadas e comparadas com passagens bíblicas. As peças eram acompanhadas por mensagens como “Bolsonaro: o governo do ódio, da corrupção e da mentira”. O balanço da ação foi a de que o programa conseguiu tirar “boas lascas do bolsonarismo entre os evangélicos”.

Campanha do ‘zap do Lula’ por evangélicos contra Bolsonaro virou ‘case de sucesso’ da estratégia de Lula em 2022, em apresentação de Ana Flávia Marques, diretora do Instituto Lula, à militância em 2023
 Foto: Reprodução

Sob a batuta do Instituto Lula, os grupos também servem para a convocação de mutirões de denúncias contra postagens de perfis políticos à direita, combinação de horários de publicações de mensagens em outras redes sociais e para críticas à imprensa. As reportagens que desagradam e repercutem no grupo são taxadas como “campanha sistemática contra o governo” ou como informações “não confirmadas”. Contudo, os desmentidos da imprensa profissional de informações falsas relacionadas aos bolsonaristas costumam ser compartilhados.

Coordenadora de grupo de WhatsApp organizado pelo Instituto Lula diz que “não há confirmação nenhuma” sobre notícia publicada na imprensa com base em informações oficiais
 Foto: Reprodução

Os grupos são abertos e se diferenciam por números, como “Zap do Lula 2530″ e “Zap do Lula 3500″, e servem para que a militância troque conteúdos pró-governo e contra opositores. Por eles também passam links para posts em outras redes sociais feitos por influenciadores e sites alinhados com o governo. Há recomendações para visitas a canais como o do Plantão Brasil, um dos maiores da rede governista e conhecido por fake news pró-governo, operado pelo influenciador Thiago dos Reis. Ele aparece numa lista de “canais sérios de esquerda” recomendada por uma das coordenadoras.

Coordenadora de grupo de WhatsApp fomentado pelo Instituto Lula recomenda Plantão Brasil, como um “canal sério de esquerda”; vídeos de Thiago Reis são marcados por desinformação pró-governo Lula
 Foto: Reprodução

Nos grupos, o método do influenciador é defendido. “Nós da esquerda temos que parar de seguir tantas regras para enfrentar os fascistas”, disse uma militante. “Muitas pessoas que se dizem de esquerda não dão ‘ibope’ para o próprio conteúdo, preferem dar audiência para certos tipos de canais de direita, como CNN, Estadão, Antagonista, Metrópoles, entre outros canais lixo”, respondeu outro.

Mensagens em defesa do método de Thiago Reis e sugestão para que esquerda “pare de seguir tantas regras” para ser efetivo na guerra das redes sociais
 Foto: Reprodução

Como mostrou o Estadão, entre os conteúdos populares publicados por Thiago dos Reis estão títulos como “Anunciada a morte de Bolsonaro!!”, “Revelada ligação de Bolsonaro com caso Marielle e provas aparecem!”, “Revelada ligação de Bolsonaro com Comando Vermelho” e “Eduardo Bolsonaro ameaça de morte Alexandre de Moraes”.

Outra utilidade dos grupos tem sido a de aproveitar o alinhamento ideológico dos membros para criação de outros grupos. Sem o vínculo institucional com o Instituto Lula e com o site do presidente, estes têm mensagens ainda mais incisivas contra opositores.

Os debates são controlados por coordenadores, que moderam comentários, convocam mutirões de denúncia e orientam sobre o que e em quem acreditar. A reportagem entrou em contato com 11 números de telefone que mais se repetem nos grupos como administradores. Nenhum deles atendeu ou retornou as chamadas. Só um deles, com DDD de Brasília, perguntou o motivo do contato, por mensagem. Quando tomou ciência, evitou a reportagem.

O site oficial de Lula foi registrado em nome de Cleber Batista Pereira, dono de uma empresa de consultoria de informática com uma dívida previdenciária de quase R$ 100 mil junto à União. Sobre o serviço que presta, primeiro ele disse por telefone que poderia responder perguntas feitas por escrito. Depois de receber a lista de questões, deixou de responder à reportagem.

Okamotto nega atuação direta do Instituto Lula

Ao Estadão, Paulo Okamotto disse que a vinda de uma pessoa ligada a Bernie Sanders serviu apenas para uma “conversa sobre o que acontece no mundo”, assim como também fez com “companheiros da Europa e da América Latina”. Ele não informou como os custos foram arcados.

Ele nega que o Instituto Lula tenha atuado na campanha por ser “apartidário”, mas diz que pessoas que formam a entidade trabalham para eleger o candidato do PT. “O Instituto Lula é uma instituição apartidária. Ele não trabalhou. Pessoas simpatizantes do instituto, eu mesmo e outras pessoas, a gente ficou na cabeça do processo. Mas na campanha essa questão dos voluntários era muito mais uma militância política partidária”, afirmou.

Ex-presidente do Instituto Lula grava vídeo para grupos que atuaram na campanha e seguem articulados; Okamotto diz que instituto não tem ligação com a estratégia e que ela seria tocada por voluntários
 Foto: Reprodução

Ainda de acordo com Okamotto, os grupos de WhatsApp estão desmobilizados. “Eram super voluntários que organizavam grupos de voluntários, montavam um rede. Tinha muita motivação, então ela (a rede) crescia, se ampliava. Com o final da campanha, com motivação menor, esse grupo foi se diluindo. Ficando grupos em alguns Estados, algumas regiões”, ponderou.

Diretora do Instituto Lula, Ana Flávia Marques também disse ao Estadão que os grupos são tocados por voluntários. “Não existe uma relação institucional. O que existe são vários grupos, que chamamos de malhas, que estavam muito organizados na campanha. Infelizmente, não conseguimos manter o mesmo nível de organização porque não tem mais a campanha. Mas eu sempre defendo que precisamos continuar organizando esse trabalho voluntário”, declarou.

Na mira da Lava Jato

O Instituto Lula entrou na mira da Operação Lava Jato por conta de doações feitas por empreiteiras que, segundo as denúncias, eram uma forma de lavar dinheiro. Os casos foram suspensos depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que as provas da Lava Jato não poderiam ser utilizadas.

Em fevereiro de 2023, o então ministro do STF, Ricardo Lewandowski, hoje ministro da Justiça do governo Lula, suspendeu o processo que tramitava na Justiça e que tinha Paulo Okamotto como um dos investigados.

Segundo o ex-sindicalista, o instituto faz planos para voltar a receber doações de empresas para que possa ter estrutura para fazer formação política. Por enquanto, segundo Okamotto, a entidade é financiada por contribuições de pessoas físicas.

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