Gilmar Mendes, agora, critica “consagração da impunidade”

Ministro que se gabou de blindar políticos marcou posição na TV contra anistia aos envolvidos do 8/1.

Recordista em concessão de habeas corpus no Supremo Tribunal Federal e decisivo no desmonte da Operação Lava Jato que resultou em impunidade geral, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, declarou à Globonews nesta terça-feira, 8 de abril de 2025, que a anistia dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023 seria a “consagração da impunidade”.

“Agora que os mentores foram descobertos, que estão sendo investigados, que a primeira denúncia foi recebida, surge essa ideia da anistia, [com seus defensores] falando sempre dessas pessoas que estavam nos acampamentos, supostamente pessoas ingênuas e que foram utilizadas.

E não faz sentido algum discutir anistia nesse ambiente. Eu acho que os próprios presidentes das duas Casas têm consciência disso. Isso seria a consagração da impunidade, num fato que foi e é extremamente grave. Não vamos nos esquecer: ‘kids pretos’ [militares das Forças Especiais] estavam autorizados a matar o presidente da República, o vice-presidente da República e o ministro Alexandre de Moraes. É disso que nós estamos falando. Crimes extremamente graves, para seguir um golpe de Estado. Isso não tem o menor cabimento.”

A declaração de Gilmar, com recado aos presidentes da Câmara, Hugo Motta, e do Senado, Davi Alcolumbre, ocorre dois dias depois da manifestação bolsonarista em São Paulo, realizada alegadamente em prol da anistia, mas repleta de discursos em defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro, atualmente réu no STF no caso da trama golpista.

Gilmar apareceu em primeiro lugar em diversos levantamentos ao longo dos anos sobre a quantidade de habeas corpus – instrumento jurídico usado para garantir a liberdade de um indivíduo – concedidos pelos ministros do STF. No período de uma década, entre 2009 e o fim de 2019, ele assinou individualmente, sem levar o caso a Plenário, 620 HCs. De 2009 e 2015, foram 50. Em 2016, 61. Em 2019, 250.

Foi naquele ano que ele votou contra a prisão em segunda instância, invertendo o voto que havia dado em 2016 e desempatando o julgamento no Supremo, o que resultou na soltura de Lula, entre outros condenados. Na Lava Jato, chegou a ordenar 21 solturas em menos de 30 dias.

Em 14 de outubro de 2023, Gilmar Mendes ainda se gabou da blindagem, exaltando o STF por ter livrado o petista da força-tarefa anticorrupção, entre outros políticos e empresários.

“Muitos dos personagens que hoje estão aqui, de todos os quadrantes políticos, só estão porque o Supremo enfrentou a Lava Jato. Do contrário, eles não estariam aqui. Inclusive o presidente da República. Portanto, é preciso compreender que papel o Tribunal jogou. Respondendo a pergunta ‘o Supremo cometeu erros ou acertos’: o Supremo mais acertou do que errou. E o Brasil muito deve ao Supremo.”

A declaração foi dada no Fórum Internacional Esfera, em Paris, em microfone da CNN Brasil, durante entrevista realizada após o ministro do STF ter participado de um painel com o então presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas. Durante o painel, Gilmar já havia dito que, “se hoje nós temos a eleição do presidente Lula, isso se deveu a uma decisão do Supremo Tribunal Federal”. Esfera é o grupo empresarial fundado pelo empresário João Camargo, aliado do ministro do STF e sogro de Bruno Dantas que passou a comandar a CNN Brasil em novembro de 2022, após a vitória de Lula sobre Jair Bolsonaro.

Em 2016, a corrupção também era tratada por ele como um crime extremamente grave. Quando a Lava Jato ainda não tinha atingido seu amigo Aécio Neves, entre outros tucanos e pessoas próximas de Gilmar, como o advogado Caio Asfor Rocha, sobrinho de sua esposa, o ministro do STF votou a favor da prisão em segunda instância, falando em “levar em conta a própria realidade, que permite que exigir o trânsito em julgado formal transforme o sistema num sistema de impunidade”.

Em 18 de setembro de 2015, o então lavajatista Gilmar havia afirmado que o PT tinha “um plano perfeito” para se “eternizar no poder”, com um “modelo de governança corrupta” que chamou de “cleptocracia”, interrompido pela força-tarefa de Curitiba.

“A Lava Jato estragou tudo. Evidente que a Lava Jato não estava nos planos. O plano era perfeito, mas não combinaram com os russos. Isso é que ficou tumultuado. A Lava Jato revelou o quê? Pelas contas do novo orçamento da Petrobras, R$ 6,8 bilhões foram destinados à propina. Se um terço disso foi para o partido, o partido tem algo em torno de R$ 2 bilhões de reais de caixa”, estimou o ministro do STF.

“Era fácil disputar eleição com isso. A campanha da presidente Dilma custou R$ 350 milhões. Por isso que eu disse: eles têm dinheiro para disputar eleição até 2038. E deixariam uns ‘caraminguados’ para os demais partidos. Era uma forma fácil de se eternizar no poder. Na verdade, o que se instalou no país nos últimos anos está sendo revelado na Lava Jato: é um modelo de governança corrupta, algo que merece o nome claro de cleptocracia”, concluiu.

Crédito O Antagonista

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