Deputado do Republicanos da Paraíba, Hugo Motta vira o favorito da vez para a presidência da Câmara.
Uma grande articulação que teve uma inusual derrapada política de Gilberto Kassab produziu uma reviravolta na disputa pela presidência da Câmara. O novo favorito para ficar com a cadeira de Arthur Lira (PP-AL) é o deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB), de apenas 34 anos, mas já em seu 4º mandato.
Os grandes vencedores do processo neste momento são, além do próprio Hugo Motta, os seguintes:
- Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara – tem ótimas relações com Hugo e dará a ele o conforto de ter na cadeira que hoje ocupa um aliado para o que der e vier;
- Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP) – o presidente tem boas relações com o Republicanos, faz um gesto também na direção de um candidato a sucessor de Lira que é bem avaliado pelo atual chefe da Câmara;
- Ciro Nogueira (PP-PI) – o presidente nacional do PP é muito ligado a Hugo Motta e vai manter, caso Motta vença, uma excelente relação na cúpula da Câmara;
- Marcos Pereira (Republicanos-SP) – o presidente nacional do Republicanos viu que tinha um muro à sua frente, pois o PL, de Jair Bolsonaro poderia vetá-lo mais adiante (pois Pereira criticou o então presidente por não ter ficado no Brasil para passar a faixa a Lula). Dessa forma, abre mão para um candidato do qual será fiador, Hugo Motta, e se fortalece para disputas futuras;
- Tarcísio de Freitas (Republicanos) – o governador de São Paulo pode ter no comando da Câmara um deputado de seu partido, o que não é pouca coisa para quem pretende se reeleger em 2026 ou até entrar na corrida presidencial.
Os derrotados, por ora, têm uma lista encabeçada pelo presidente do PSD, Gilberto Kassab, e pelo seu candidato a presidente da Câmara, o deputado federal Antonio Brito (PSD-BA). Outro derrotado e que ainda tenta reverter o quadro é o deputado federal Elmar Nascimento (União Brasil-BA), até anteontem o favorito na disputa.
Havia resistências ao nome de Elmar dentro do PT da Bahia. Ele confiou no apoio que teve, verdadeiro, de Arthur Lira. Mas acabou solapado –ao menos momentaneamente– pela articulação de Marcos Pereira, que desistiu de ser candidato para se transformar no fiador de Hugo Motta na disputa na Câmara.
Marcos Pereira acabou dando um nó tático político em Gilberto Kassab. Para entender o que se passou, é necessário recapitular alguns pontos.
Primeiro, qual era o quadro até a semana passada: havia 3 candidatos na disputa, todos dizendo que não iriam sair de jeito nenhum da disputa: Elmar Nascimento (União Brasil), Marcos Pereira (Republicanos) e Antonio Britto (PSD).
Cada 1 dos 3 candidatos enfrentava dificuldades.
Elmar tinha o maior número de votos já assegurados. Na sua megafesta de aniversário no início de julho, mostrou força com centenas de deputados presentes. Só que sempre havia uma dúvida se poderia sofrer alguma reviravolta pelo fato de ser adversário do PT na Bahia. Essa dúvida persiste ainda hoje, embora seja inegável que Elmar tenha ouvido promessa de apoio de mais de 300 deputados neste ano.
Marcos Pereira tinha apenas o apoio certo do Republicanos (que tem 44 dos 513 deputados). Desfruta de bom trânsito também com Lula. Mas enfrenta a resistência de Jair Bolsonaro e, portanto, do PL.
Antonio Brito (PSD) era considerado o predileto do Planalto e do PT, mas também sempre se mostra muito dependente de Gilberto Kassab. Ninguém enxerga como positivo eleger alguém para comandar a Câmara e depois ter de passar 2 anos pedindo audiências por meio de Kassab.
Nessas horas, vence quem decide tomar a atitude mais ousada. Foi o caminho de Marcos Pereira, que desistiu de ser candidato para sair mais forte do processo, como principal fiador do próximo presidente da Câmara.
Marcos Pereira notou que a disputa estava se afunilando a favor de Elmar Nascimento. Fez vários movimentos que também estiveram imbricados com os de seus adversários:
- conversa com Kassab – na última 6ª feira (30.ago), Marcos Pereira pediu apoio a Kassab numa conversa no apartamento do chefe do PSD, que fica num prédio atrás do shopping Iguatemi, na capital paulista. Kassab escutou, mas negaceou. Pereira então foi explícito: “Se você me apoiar, ficarei eternamente grato, jamais me esquecerei. Mas se você recusar, vou também lembrar para o resto de minha vida que você não me deixou chegar à presidência da Câmara”. Não adiantou. Tido como um dos mais hábeis articuladores políticos do Brasil, Kassab preferiu dizer que ainda era cedo para fazer um movimento de desistência;
- viagem a Santa Catarina – no sábado (31.ago), Marcos Pereira foi até Santa Catarina. Objetivo: falar com um dos mentores de Kassab, o ex-senador e ex-ministro Jorge Bornhausen, que está com 87 anos. Também não teve sucesso, pois a conversa não surtiu efeito;
- aliança com Tarcísio de Freitas – como é do mesmo partido do governador de São Paulo, Marcos Pereira o procurou para discutir a situação. Tarcísio telefonou para Kassab na 2ª feira –afinal, o chefe do PSD ocupa o cargo de secretário de Governo e Relações Institucionais na administração paulista. Pediu apoio a Pereira. De novo, não deu nada certo. Kassab repetiu que era necessário esperar mais;
- o Planalto entra no processo e chama Kassab – sem estar na agenda oficial, Lula chamou Kassab para conversar na 3ª feira (3.set) pela manhã, em Brasília. Foi uma conversa franca. O presidente disse que está sendo cuidadoso no processo de sucessão da Câmara e que respeita as escolhas dos deputados e de Arthur Lira. Mas disse também que era importante haver uma unificação de candidaturas. Aí pediu que o candidato do PSD, Antonio Brito, desistisse para reforçar a candidatura de Marcos Pereira. Foi nessa reunião que Kassab cometeu seu maior erro em tempos recentes: disse não ao petista, alegando ser necessário esperar um pouco mais;
- desistência de Marcos Pereira – ao acompanhar todos esses movimentos, Marcos Pereira lembrou de uma frase que ouvira já há algum tempo de Arthur Lira: “Você é o presidente do Republicanos, é candidato a presidente da Câmara e eu não posso me colocar contra. Mas se o candidato de vocês fosse Hugo Motta, tudo seria mais tranquilo”. É que Lira é muito próximo de Hugo Motta (com quem tem uma amizade sólida, embora não com a intimidade fraternal que mantém com Elmar).
Marcos Pereira desembarcou na 3ª feira em Brasília e rumou diretamente para o Planalto. Sem horário marcado, foi recebido por Lula. Anunciou que iria desistir e apoiar o nome de Hugo Motta para ser o sucessor de Lira.
Na conversa, Marcos Pereira ouviu de Lula que o Planalto e Arthur Lira trabalhavam para ter um nome de consenso. O petista disse não conhecer Hugo Motta muito bem e que achava ele bem jovem (quando Lula disputou o 2º turno para presidente em 1989, Motta era um bebê de 2 meses). O presidente também quis saber se Motta não seria excessivamente ligado a Lira. Marcos Pereira ponderou que estava ali pessoalmente se apresentando como um fiador da nova candidatura, que entendia que o cenário poderia ser pacificado e a disputa ser mais tranquila na primeira semana de fevereiro de 2025, quando são feitas as trocas no comando das duas Casas do Congresso.
ELMAR NASCIMENTO
Com uma campanha consolidada e muitos votos até em partidos de esquerda, o deputado Elmar Nascimento tomou um duro golpe ontem. Quando Arthur Lira e ele conversaram no início da noite, o clima não foi dos melhores.
Elmar não quer desistir. Acha que pode conseguir reverter o quadro. Atribui ao PP, sobretudo ao presidente desse partido, Ciro Nogueira, a articulação dos últimos dias. Cobrou de Arthur Lira o apoio para continuar na disputa. Chegou a dizer que está disposto a ir para a oposição e entregar cargos que o partido, União Brasil, tem no governo. Essa é uma hipótese bem improvável.
No final da manhã desta 4ª feira, Elmar foi conversar pessoalmente com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Quer tentar manter o apoio do partido bolsonarista (que tem 92 dos 513 deputados). Bolsonaro também nesta 4ª feira recebe Tarcísio de Freitas para tratar de vários assuntos políticos, como a disputa pela Prefeitura de São Paulo e também a sucessão na Câmara.
Neste momento, o quadro na Câmara segue aberto. Hugo Motta se transformou no novo favorito. Elmar resiste. Antonio Brito é apenas um azarão e conta com o apoio do derrotado –neste momento– Gilberto Kassab.
Caso o cenário se mantenha e Hugo Motta seja eleito presidente da Câmara, a derrota de Gilberto Kassab fica ainda maior. É que ele sonha em 2026 ser candidato a vice-governador na chapa em que Tarcísio de Freitas vai encabeçar para tentar ser reeleito. Só que Marcos Pereira, com o gesto desta semana, fica muito forte no Republicanos e pode ser um obstáculo grande para os planos kassabistas daqui a 2 anos.
No caso de Elmar Nascimento, o rumo que está tomando de procurar Bolsonaro e sinalizar mais para a oposição pode também resultar em problemas futuros. Se Elmar acabar ganhando a presidência da Câmara, tudo se dissipa. Se perder, ficará sem nenhum tipo de espaço no governo nos 2 últimos anos de mandato –e enfrentando o PT da Bahia em sua base eleitoral.