Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo
Assessores diretos do presidente têm se incomodado com a indisciplina do petista em eventos públicos e avaliam que controvérsias atrapalham a recuperação de sua popularidade
A espontaneidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em discursos feitos em eventos públicos tem incomodado seus assessores diretos. Por vezes, integrantes de sua equipe combinam uma estratégia de comunicação que acaba descumprida pelo chefe do Executivo. Nesses casos, as declarações, muitas vezes controversas, acabam chamando mais atenção do que o foco da agenda do governo.
Lula é tido como “incontrolável” e, mesmo quando foge do que foi acordado, dificilmente alguém tem espaço para dar uma bronca no chefe. Dos 38 ministros na Esplanada, apenas um deles tem ampla liberdade para chamar o presidente pelo nome –Luiz Marinho, que convive com Lula desde os tempos de sindicalismo em São Bernardo do Campo (SP).
Essa distância e falta de intimidade com o presidente acabam impedindo assessores de falar o que pensam a Lula. Por essa razão, a preocupação tem sido levada à mesa em conversas amenas e de forma cuidadosa.
O próprio presidente criticou publicamente a comunicação de seu governo. Só que ele atribui tudo a uma falha de estratégia da sua equipe, que acaba resultando numa avaria em sua popularidade.
Pesquisa do PoderData divulgada em 27 de março, mostrou que 47% dos brasileiros dizem “aprovar” o governo Lula e 45% declararam “desaprovar”. As taxas empatam na margem de erro do levantamento, de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.
Os percentuais oscilaram desfavoravelmente ao presidente quase de maneira contínua desde o início do mandato, há 15 meses. As curvas da pesquisa PoderData, o estudo sobre avaliação do governo realizado com maior frequência no Brasil, mostram com clareza a tendência.
No início do mandato, a distância entre quem aprovava para quem desaprovava o governo era de 13 pontos percentuais. Agora, só 2 pontos.
No aniversário de 44 anos do Partido dos Trabalhadores, realizado em Brasília em 20 de março, Lula confessou que muitas vezes não consegue se segurar. “Quando eu vejo um microfone, me dá coceira nos dentes”, disse ao subir ao palco. O petista relatou que havia combinado com a primeira-dama, Janja Lula da Silva, que não discursaria no evento. O Poder360 apurou que a promessa de não falar foi feita também a vários assessores.
Ao descumprir o prometido, Lula criticou a decisão da Justiça de Barcelona, na Espanha, que havia concedido liberdade provisória ao ex-jogador de futebol Daniel Alves caso pagasse uma fiança de € 1 milhão (cerca de R$ 5,4 milhões), o que acabou acontecendo dias depois.
Condenaram Daniel Alves a 4 anos e 6 meses de prisão por agredir sexualmente uma jovem de 23 anos em 2022 na boate Sutton, em Barcelona. O julgamento encerrou-se em 7 de fevereiro de 2024, e divulgaram a condenação em 22 de fevereiro. Dos 4 anos e meio de condenação, ele já cumpriu 1 ano e 1 mês em prisão preventiva, pois o detiveram em janeiro de 2023.
A declaração foi considerada por ministros como desastrosa porque o presidente não precisava ter se envolvido no caso. Também considerou-se que, embora a decisão desagrade ao presidente, está dentro dos parâmetros legais da Justiça da Espanha.
Na reunião ministerial de 18 de março, os ministros do Palácio do Planalto haviam combinado com o presidente que ele faria uma declaração inicial simples para abrir a reunião. O cerne do encontro seria a apresentação que o ministro da Casa Civil, Rui Costa, faria sobre os resultados positivos do governo –fazendo uma comparação objetiva com o governo anterior, de Jair Bolsonaro (PL).
Só que ao abrir o encontro, Lula saiu do script. Fez um discurso do tipo palanqueiro. Disse que não houve golpe de Estado no Brasil no 8 de Janeiro porque Bolsonaro foi um “covardão” e não executou o que planejou. Sem citar nominalmente seu antecessor, afirmou que o país correu “sério risco” e que “por pouco não voltou aos tempos tenebrosos”. Para completar, afirmou que Rui Costa parecia estar “desanimado”.
A declaração ofuscou a apresentação do ministro da Casa Civil, que havia preparado um documento com 48 slides em que mostrava o aumento de benefícios do Bolsa Família, redução do desemprego e aumento do salário mínimo. Os recortes são de 2017 até 2023. O ministro destacou ações da administração petista sem apontar problemas.
Os resultados positivos do titular da Casa civil quase não reverberaram nas mídias sociais, pois só se falava na menção de Lula a Bolsonaro, chamado de “covardão”.
Na viagem que fez ao Egito e à Etiópia, em fevereiro, Lula comparou a operação militar de Israel na Faixa de Gaza com o extermínio de judeus realizado por Adolf Hitler na Alemanha nazista. A declaração foi duramente criticada por autoridades judaicas, especialmente o ministro das Relações Exteriores, Israel Katz.
Em 6 de março, a pesquisa de avaliação do governo Genial/Quaest mostrou que 60% dos brasileiros consideraram que Lula “exagerou” ao fazer a comparação. O próprio governo reconheceu que a declaração foi prejudicial à popularidade do presidente.