O Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (TJ-AM) decretou nesta quarta-feira (29) a prisão definitiva de Luciane Barbosa Farias, conhecida como “dama do tráfico amazonense”. Ela é casada com Clemilson dos Santos Farias, o “Tio Patinhas”, líder do Comando Vermelho na região.
Luciene ficou conhecida nacionalmente em 2023 após o Estadão revelar que ela foi recebida por assessores do então ministro da Justiça Flávio Dino, na sede da pasta. O nome dela foi incluído no Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões (BNMPP).
Luciene e o marido foram condenados pelos crimes de associação ao tráfico, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A Justiça determinou que os dois devem começar a cumprir as penas imediatamente, pois o processo já transitou em julgado, ou seja, não é mais possível contestar a condenação. A informação foi divulgada pela coluna de Tácio Lorran, no portal Metrópoles
Ela aguardava a tramitação dos recursos em liberdade e foi sentenciada a 10 anos de prisão, já Tio Patinhas foi condenado a 31 anos e sete meses. A desembargadora Vânia Maria Marques Marinho, relatora do caso no TJ-AM, considerou que os dois atuaram em conluio “para ocultar ou dissimular a ilegalidade do dinheiro proveniente do tráfico de drogas”.
O Ministério Público do Amazonas classificou Luciene como “braço financeiro” do marido. O MP relatou na denúncia que Clemilson tem “fama de indivíduo de altíssima periculosidade, com desprezo à vida alheia”.
Visitas da “dama do tráfico” ao MJ em 2023
No dia 19 de março de 2023, Luciane esteve com Elias Vaz, secretário Nacional de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. Pouco tempo depois, em 2 de maio, ela se encontrou com Rafael Velasco Brandani, titular da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen).
Luciane entrou no Ministério da Justiça como presidente da Associação Instituto Liberdade do Amazonas (ILA), uma ONG de defesa dos direitos dos presos. Segundo a polícia civil do Amazonas, a entidade atua em prol dos detentos ligados à facção criminosa. A organização também seria financiada com dinheiro do tráfico.
O então ministro da Justiça Flávio Dino disse à época que nunca recebeu líderes de facção em seu gabinete e que não sabia das reuniões dos secretários da pasta. “Nunca recebi, em audiência no Ministério da Justiça, líder de facção criminosa, ou esposa, ou parente, ou vizinho. De modo absurdo, simplesmente inventam a minha presença em uma audiência que não se realizou em meu gabinete”, afirmou Dino.
“Sobre a audiência, em outro local, sem o meu conhecimento ou presença, vejam a história verdadeira no Twitter do Elias Vaz. Lendo lá, verificarão que não é o que estão dizendo por conta de vil politicagem”, acrescentou.
Na ocasião, Vaz confirmou que se reuniu com Luciane no dia 16 de março a pedido da ex-deputada estadual do Rio Janira Rocha. Além da parlamentar, também participaram do encontro duas mães de vítimas do tráfico de drogas no Amazonas que, segundo ele, apresentaram uma carta de “socorro” ao governo.
“Quanto à Sra. Luciane, ela estava como acompanhante da advogada Janira Rocha, e se limitou a falar sobre supostas irregularidades no sistema penitenciário. Por esta razão, foi sugerido à advogada Janira Rocha que elas procurassem a Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen)”, disse Vaz em referência à secretaria tocada por Brandani.
Após a divulgação das reuniões, Luciene negou ser faccionada e reforçou que as visitas ao MJ faziam parte de uma articulação política pelos direitos humanos no sistema carcerário. “Não sou faccionada de nenhuma organização criminosa e venho, como inúmeras outras esposas e familiares, sendo criminalizada pelo fato de ser esposa de um detento”, escreveu em nota publicada no Instagram em 13 de novembro de 2023.
Ela também participou de um evento promovido pelo Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT), do Ministério dos Direitos Humanos (MDH), que arcou com as despesas de sua viagem até Brasília. As despesas de Luciene foram pagas pela Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos.
Em nota divulgada à época, o MDH afirmou que “o pagamento de passagens e diárias foi feito a todos os participantes de um evento nacional, com orçamento próprio reservado ao Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT) e cujos integrantes foram indicação exclusiva dos comitês estaduais”.
Outras reuniões da “dama do tráfico”
Luciene também se encontrou com os deputados federais Guilherme Boulos (Psol-SP) e André Janones (Avante-MG); e com o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, em seu gabinete no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Na época, Janones afirmou que atende todas as pessoas que chegam para falar com ele e que, no dia do encontro, foram ao seu gabinete “diversas mulheres que se apresentaram como representantes de associações civis em defesa dos direitos humanos, bem como duas mães que tiveram os filhos vítimas de crimes e aguardam por Justiça”. Já Boulos não se pronunciou sobre o encontro na ocasião.
Em nota, o ministro Vieira de Mello informou que, “segundo informações prestadas”, a ONG de Luciane “representa familiares de presos, egressos, reclusos, além da comunidade em geral”. “O agendamento da reunião constou da agenda pública do Conselheiro que, na oportunidade, recebeu documentação com projetos e denúncias sobre a questão prisional no Estado do Amazonas”, afirmou o CNJ, em nota divulgada no dia 13 de novembro de 2023.