II – O CONTRAGOLPE
Por Ultima Hora
“Cumpro o dever de alertar a nação para o complô que se organiza contra o regime. Prepara-se um golpe de Estado que tem por objetivo derrubar as instituições democráticas, e o chefe da conspiração chama-se João Belchior Marques Goulart. O movimento subversivo que ora se articula não é o primeiro que o senhor João Goulart procura fazer deflagrar visando ao fechamento do Congresso Nacional e a destruição da Constituição”.
Deputado Armando Falcão, em denúncia publicada no Jornal do Brasil e no Estado de S Paulo – 22 de novembro de 1963
O movimento subversivo que ora se articula não é o primeiro que o senhor João Goulart procura fazer deflagrar visando ao fechamento do Congresso Nacional e a destruição da Constituição”.
Deputado Armando Falcão, em denúncia publicada no Jornal do Brasil e no Estado de S Paulo – 22 de novembro de 1963
Duas foram as causas imediatas do movimento militar de 1964. A primeira, o temor da comunização do país, com a crescente influência das esquerdas no governo, principalmente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), que alardeava reformas de base “no voto ou na marra”.
O receio da instalação de uma república sindicalista não era infundado, e foi reforçado com a bravata do histórico comunista Luís Carlos Prestes, que retornara de Moscou em janeiro daquele ano com a missão de desencadear a guerra civil: “Já estamos no governo, só nos falta o poder”.
De fato, era o próprio Presidente Jango Goulart, insuflado pelo seu jacobino cunhado Leonel Brizola, quem afiançava a ameaça, subvertendo as instituições e dinamitando o quadro político legal.
A segunda, um risco quase não lembrado hoje – a iminente subversão militar – na época não percebido na sua verdadeira dimensão pelo país civil, mas que praticamente desencadeou a reação das Forças Armadas.
A crise militar tomou um rumo insustentável, tendo a esquerda mobilizado os oficiai.hc subalternos contra os superiores das três Forças, com as bençãos do próprio Presidente, arregimentando e doutrinando o “proletariado militar” contra a “burguesia” fardada.
Sargentos do Exército chegaram a dominar pelas armas uma área de Brasília; marinheiros revoltaram-se, abandonaram seus navios e homiziaram-se no sindicato dos metalúrgicos do Rio de Janeiro; fuzileiros navais, acionados para prendê-los, com eles se confraternizaram, aderindo ao motim.
Era a deterioração – aceita e incentivada pelo próprio governo – da hierarquia e da disciplina, pilares básicos das Forças Armadas. Descobriu-se, posteriormente, que já existiam “lista de eliminação” de oficiais superiores, caso os amotinados fossem vitoriosos.
Jango decidiu “lançar a sorte” em março de 1964. Desprezando a prudência e confiando em um “dispositivo militar” do seu entorno que imaginava leal e capaz de suportar suas intenções subversivas.
No dia 13, ele participou de um comício na Central do Brasil, no Rio de Janeiro, onde não só expôs claramente seus objetivos sindicalistas controversos, como alardeou um apoio que sabia não contar – uma provocação temerária – das Forças Armadas, ao seu governo.
No dia 15, Jango enviou mensagem conclamando o Congresso a apoiar suas propostas de reformas.
Em 19, aconteceu a Marcha da Família com Deus e pela Liberdade, em São Paulo, com mais de 500 mil pessoas na maior manifestação pública já ocorrida no Brasil contra um governo, até então.
Em 20, o Governador Magalhães Pinto fez uma primeira declaração pública, em nome do povo de Minas Gerais, pela manutenção da ordem no país. Nesse mesmo dia, o General Castelo Branco publicou uma circular do Estado-Maior, distribuída às unidades do Exército, em defesa da Constituição, e um documento sigiloso, o LEEX (Lealdade ao Exército), que nas entrelinhas conferia legitimidade à conspiração, e a desobediência ao Presidente.
Em 30 de março, o Presidente Jango compareceu à festa dos Sargentos, no Automóvel Clube do Brasil, no Rio de Janeiro, onde discursou juntamente com o Cabo Anselmo (praça da ativa!), em um último chamamento às pautas revolucionárias de seu governo.
Era inexplicável, um político experiente como Jango insistir na ilusão estratégica de que poderia permanecer no poder subvertendo a ordem legal democrática, degradando os valores da ordem militar, que deveria sustentá-la.
E a situação se complicava, com o canhestro aparato paramilitar, de cerca de 30 mil homens, improvisados em armamentos, veículos e até aeronaves, mobilizado pelas lideranças civis de direita – os governadores Adhemar de Barros de São Paulo e Carlos Lacerda do Rio de Janeiro – dispostos a reagir com a devida violência ao que classificavam como “sórdidas ações comunistas”.
A “Revolução” foi deflagrada no dia 30 de março (e não 31) de 1964, pelo governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto, em reunião com o General Luís Guedes, comandante da Infantaria Divisionária da 4ª Divisão de Infantaria, sediada em Belo Horizonte. Na ocasião, foi lido o “Manifesto de Minas”, em que o estado se considerava desvinculado da União, até à substituição do presidente da República.
Na madrugada do dia 31, o General Olympio Mourão, Comandante da 4ª Região Militar, saindo de Juiz de Fora deslocou-se para o Rio de Janeiro, comandando tropas do Exército e um contingente de policiais militares, dando início à operação militar. A adesão militar de São Paulo se configurou em seguida, com os efetivos comandados pelo General Amaury Kruel, também se deslocando para o Rio de Janeiro.
Informado da adesão ao movimento dos Governadores de Minas, São Paulo e Mato Grosso, entre outros, o Presidente Goulart reuniu-se com seu círculo mais próximo no Palácio Laranjeiras, no Rio de Janeiro, em 31 de março, na tentativa de esboçar uma reação.
Ciente de que a iniciativa da guerra civil estava em suas mãos, e constatando haver perdido os apoios que contava, inclusive de seus ministros, ele foi aconselhado a sair do país, seguindo para Brasília na madrugada de 01 de abril, e depois para Porto Alegre e o Uruguai, em 02 de abril. Nesse mesmo dia, 29 senadores e 183 deputados, ouviram o Presidente do Congresso, Senador Auro de Moura Andrade, abrir a sessão dizendo: “Comunico ao congresso Nacional que o Sr João Goulart deixou, por força dos notórios acontecimentos de que a nação é conhecedora, o governo da república”.
E após acalorados debates, proclamou: “Há necessidade de que o Congresso Nacional, como poder civil, tome a atitude que lhe cabe, nos termos da Constituição, […] Assim sendo, declaro vaga a Presidência da República!”
A rigor, o movimento militar de 1964 não se enquadra no conceito histórico-cultural de “revolução”, termo adotado pelos militares, mais adequado a um evento social de maiores consequências para os padrões de existência de um povo, como a Revolução Francesa de 1789, por exemplo.
Também não podemos chamá-lo de “rebelião”, ou “revolta”, caracterizadas por ações locais de menor envergadura, contra autoridades subordinadoras imediatas, para extinguir situações consideradas injustas ou opressoras, mas que procuram não modificar as estruturas políticas. Tampouco “golpe de estado”, rótulo que muitos lhe conferem, o distingue com exatidão, porque por definição este não conta com participação do povo, ou apoio civil, em virtude do sigilo que operação dessa natureza exige para ser bem-sucedida.
Contrariando narrativas esquerdistas, a ação dos políticos e militares brasileiros em 31 de março de 1964, com apoio dos governos estaduais, da massa da população, da Igreja, e dos meios de comunicação, foi um contragolpe, para defender nossa democracia do assalto comunista às instituições, oriundo do próprio governo e prestes a se concretizar.
Foi um ato em legítima defesa dos valores da sociedade brasileira, que procurou situar-se dentro da Constituição, e visou somente a deposição do presidente, deixando a princípio preservados o Judiciário e o Legislativo.
Gen Marco Aurélio Vieira
Foi Comandante da Brigada de Operações Especiais e da Brigada de Infantaria Paraquedista
Uma resposta
Tenho 62 anos.
Gaúcho, natural de Carazinho – RS.
Exato o contorno do articulista. Foi um contra-golpe.
Sempre ouvi assim de meu falecido pai.