Segundo reportagem da Folha de SP, o Ministério da Saúde emprega milhares de funcionários não concursados, contratados principalmente como bolsistas e consultores, para atuar em áreas essenciais da pasta.
Apesar disso, a lista com os nomes e remunerações desses cargos é mantida em sigilo, mesmo após a Controladoria-Geral da União (CGU) ordenar que a pasta divulgue os dados em um processo baseado na Lei de Acesso à Informação, aberto pela Folha.
A dependência das bolsas atravessa diferentes governos e foi intensificada pela redução dos concursos, permanecendo também durante a gestão de Lula (PT). Contudo, a falta de transparência levanta preocupações, especialmente porque parte desses cargos abriga nomes ligados a autoridades.
Um exemplo é o jornalista José Camapum, primo da esposa do secretário-executivo da Saúde, Swedenberger Barbosa. Ele recebe cerca de R$ 8 mil para atuar na Ouvidoria do ministério, ganhando mais do que seus colegas devido a uma bolsa originalmente destinada a um setor com salário mais alto.
Outro caso é o do dentista Marcelo Haas Villas Bôas, filho do general Villas Bôas. Ele atuou como bolsista no ministério de 2020 a janeiro de 2023, com remuneração de cerca de R$ 7,5 mil. Parte de seu trabalho nesse período envolvia representar a Secretaria de Saúde Indígena em reuniões sobre a Covid, uma área que foi alvo de loteamento por militares sob o governo Bolsonaro.
Em 2021, durante o governo Bolsonaro, o ministério chegou a liberar parte da relação de funcionários não concursados. Essa lista continha mais de 2,5 mil nomes e representava cerca de R$ 16,3 milhões em salários mensais. O pagamento mais alto registrado alcançava R$ 12 mil.
Apesar de ser uma lista parcial, ela ainda supera em número os servidores concursados ou comissionados da administração do Ministério da Saúde em Brasília. Segundo informações divulgadas em novembro de 2023, havia cerca de 2.130 funcionários nessa categoria.
No governo Lula, o ministério apresentou dados ilegíveis em resposta aos pedidos feitos pela Folha sobre a lista de bolsistas e consultores. Diante de novos questionamentos, a pasta passou a se recusar a divulgar qualquer tabela.
O ministério justifica que as instituições que contratam esses funcionários detêm os dados e devem apresentá-los. No entanto, integrantes da equipe de Nísia Trindade afirmam, reservadamente, que há receio de que a lista revele vínculos de bolsistas com o ministério e possa ser usada como munição em ações trabalhistas.
Em nota, a Saúde informou que está finalizando o levantamento dos dados para divulgar a relação de não concursados, mas não estabeleceu um prazo para a resposta. A pasta também anunciou que a Fundação Getúlio Vargas (FGV) conduzirá um levantamento para identificar e apontar melhorias nas contratações desses tipos de projetos, que têm sido executados ao longo dos últimos anos.
Além disso, a Fiotec, fundação ligada à Fiocruz, e a Opas (Organização Pan-Americana da Saúde) são as entidades que fornecem a maior parte da mão de obra da Saúde por meio de bolsas e consultorias.
“Se existem consultores atuando como agentes públicos, no âmbito desses acordos de cooperação, nas instalações ou com recursos do Ministério da Saúde, tais colaboradores precisam ter seus dados devidamente publicados”, disse a CGU ao mandar a Saúde entregar os dados sobre funcionários não contratados.
A reportagem pediu à Saúde o acesso à lista dos funcionários não concursados em 9 de outubro do ano passado. Após diversos recursos, a Controladoria determinou, em 6 de fevereiro, que a Saúde teria até o dia 7 de março para entregar os dados. Em nota, a CGU afirmou que a Saúde agora apresentou um recurso no processo de Lei de Acesso à Informação, chamado de incidente de correção, que suspendeu este prazo.