Os vídeos das audiências da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid foram tornados públicos nesta quinta (20) após o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), ampliar o acesso das defesas aos conteúdos apurados. A colaboração em si teve o sigilo derrubado na quarta (19, mas as gravações estavam restritas por conta da privacidade e segurança dos servidores e juízes auxiliares que conduziram as sessões.
Algumas sessões de tomada de depoimento de Cid foram conduzidas pelo próprio ministro Alexandre de Moraes e pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, além de advogados, enquanto outras tiveram juízes auxiliares e outros integrantes do Judiciário.
Segundo Cid, em uma das gravações, Bolsonaro sempre dava a entender que algo poderia acontecer para convencer as Forças Armadas. “O ex-presidente mantinha a chama acesa”, disse afirmando que não acreditava que um suposto golpe poderia acontecer.
“Ele tinha esperança que, até o último momento, fosse aparecer uma prova cabal que houve fraude nas urnas. E teria o povo na rua, mobilização, Forças Armadas”, emendou citando um prazo até o dia 31 de dezembro de 2022.
Em outro, ele cita uma cobrança do tenente da reserva Aparecido Portela, suplente da senadora Tereza Cristina (PP-MS), de organizadores do acampamento montado em Brasília por alguma ação que poderia levar ao suposto golpe.
“A pressão estava começando, ainda mais dele, porque ele conhecia o pessoal do agro. E o pessoal do agro, não vendo nada acontecer, eles achavam que ia acontecer alguma coisa, eles estavam naquele ‘é hoje, hoje vai acontecer’, nessa angústia de esperar que fosse dado o golpe, que o presidente assinasse um decreto e as Forças Armadas fossem fazer alguma coisa”, disse ressaltando que houve contribuição para a mobilização popular.
Mauro Cid disse, ainda, que recebia centenas de mensagens de pessoas perguntando se seria adotada alguma ação para “virar a mesa” contra a posse do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Veja em instantes, na Gazeta do Povo, a íntegra dos vídeos em instantes.
Defesa pediu acesso às gravações
Nesta quinta (20), Moraes atendeu a um pedido da defesa de um dos 34 denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) para ter acesso às gravações. Entre eles estão, ainda, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e os ex-ministros generais Walter Braga Netto e Augusto Heleno.
“A garantia constitucional da ampla defesa e do contraditório exige que os denunciados tenham acesso a todos os documentos e provas utilizados pelo Ministério Público no momento do oferecimento da denúncia”, escreveu Moraes no despacho a que a Gazeta do Povo teve acesso.
Mauro Cid afirmou, na delação, que Bolsonaro não aceitava passar o Poder para o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e que tentou encontrar fraudes nas urnas eletrônicas ou convencer as Forças Armadas a aderirem a um suposto plano de golpe de Estado.
“QUE o ex-Presidente JAIR BOLSONARO tinha certeza que encontraria uma fraude nas umas eletrônicas e por isso precisava de um clamor popular para reverter a narrativa: QUE o ex-Presidente estava trabalhando com duas hipóteses: a primeira seria encontrar uma fraude nas eleições e a outra, por meio do grupo radical, encontrar uma forma de convencer as Forças Armadas a aderir a um Golpe de Estado”, disse Cid em um dos depoimentos à Polícia Federal.
A delação de Cid consta em um processo dividido em quatro longos volumes que somam mais de 800 páginas e relatam, ainda, a suposta operação para adulterar o cartão de vacinação contra a Covid-19 a mando de Bolsonaro; a venda de joias recebidas de presente de autoridades estrangeiras; e o alegado “gabinete do ódio” para a “criação e repercussão de notícias não lastreadas ou conhecidamente falsas com o objetivo de atacar integrantes de instituições públicas, desacreditar o processo eleitoral brasileiro, reforçar o discurso de polarização”.
Cid também relata o que tinha conhecimento da suposta tentativa de interferência no deslocamento de eleitores do Nordeste no segundo turno da eleição de 2022 pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), a atuação do hacker Walter Delgatti para encontrar vulnerabilidades na urna eletrônica, entre outros assuntos.
O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro afirmou que o planejamento de todo o suposto golpe de Estado se deu em “praticamente dois meses desde o final da eleição, até quando o presidente Bolsonaro deixou o país, deixamos o país por término de mandato”.