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O histórico de autoritarismo do ministro da Justiça

Foto – André Borges/EFE

Ricardo Lewandowski sustenta a tese de que a imunidade parlamentar é relativa e não se aplica a crimes contra a honra

Tendo saído do Supremo Tribunal Federal em 2023 e assumido o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública neste ano — ambos os postos ocupados graças à indicação e nomeação de Luiz Inácio Lula da Silva —, Ricardo Lewandowski esteve nos holofotes na última terça-feira, 3. Ele marcou presença em uma audiência da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados e defendeu o indiciamento de parlamentares por declarações feitas da tribuna.

Deputados como Marcel van Hattem (Novo-RS) e Gilberto Silva (PL) foram indiciados pela Polícia Federal por comentários verbalizados na Câmara, do púlpito, sobre as investigações do diretor da Polícia Federal Fábio Schor em inquérito supervisionado pelo ministro Alexandre de Moraes. Denunciaram o que consideram inadequado na conduta de um funcionário público. O artigo 53 da Constituição brasileira garante a imunidade parlamentar por quaisquer opiniões, palavras e votos. A Procuradoria Parlamentar da Câmara já se manifestou, em gesto que aplaudimos — antes tarde do que nunca o Legislativo elevar o tom contra pelo menos alguns entre os vários abusos que se sucedem! —, afirmando que esses indiciamentos são perseguições políticas. Não nos alonguemos nessa recapitulação.

A questão é que Lewandowski discordou. Para ele, está tudo bem. A imunidade parlamentar não se aplicaria a “crimes contra a honra”. Prova de que esse entendimento já estaria em vigência, de acordo com ele, seria o processo contra o ex-deputado Daniel Silveira — caso em que, embora também discordemos da ação penal perpetrada, as declarações não foram feitas da tribuna. Não importa para o ministro da Justiça. “Se, da tribuna, um deputado cometer um crime contra a honra, seja contra colega ou qualquer cidadão, ele não tem imunidade em relação a isso. Até porque a vida do Parlamento seria inviabilizada com ataques à honra. Em proteção ao cotidiano, o Supremo assentou essa jurisprudência. Portanto, os inquéritos da PF levaram isso em consideração”, asseverou Lewandowski.

O ministro da Justiça deixou claro que, sempre que os iluminados de nossa burocracia jurídica entenderem que a “honra” de alguém foi violada, as “quaisquer opiniões, palavras e votos” darão lugar a um altissonante “cale a boca”. Muitas vozes lúcidas já se levantaram contra a natureza autoritária desse “diagnóstico”. Gostaria apenas de contribuir com uma recordação histórica, demonstrando que Lewandowski pouco fez com essa declaração além de honrar a consistência de sua biografia. Ele não foge à regra das personalidades que compõem este governo e macaqueiam um amor pela democracia e pela sociedade aberta que não passa de ilusão.

Foi de Lewandowski a decisão que, em 2016, atentou contra a Constituição durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff. “Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis”, diz o artigo 52 — logo antes, aliás, do artigo 53 ora em questão.

Que fez Lewandowski? Ele acatou um pedido de destaque articulado por peemedebistas e aliados do petismo, livrando Dilma da inabilitação. Já então, o STF, supostamente o guardião da Constituição Federal, permitiu que, com muito menos votos do que os necessários para aprovar uma emenda constitucional, um artigo explícito da Carta Magna de 88 fosse fragmentado. “Não gostamos dele, não queremos obedecê-lo.” Simples assim. Tudo que veio depois e os descalabros a que assistimos até hoje são desdobramentos das brechas que foram toleradas lá atrás — e Lewandowski foi protagonista desse processo.

Outro episódio do mesmo ano ajuda também a compor o personagem. O STF enviou à Polícia Federal um pedido para investigar os responsáveis por levar bonecos infláveis satirizando Lewandowski e o então procurador-geral Rodrigo Janot para manifestações populares na Avenida Paulista. Segundo o secretário de Segurança da cúpula togada na época, Murilo Hertz, os bonecos representavam “grave ameaça à ordem pública e inaceitável atentado à credibilidade”. A “honra” de Lewandowski estava sendo atacada! Inadmissível. Era preciso, dizia ainda o secretário, “interromper a nefasta campanha difamatória contra o chefe do Poder Judiciário”.

Não foram palavras diretas de Lewandowski, mas claramente o secretário de Segurança do STF não estava agindo, diante de um boneco ironizando o então presidente do órgão, por acaso… Se o honorável ministro não tolera a liberdade de expressão e crítica do povo, que dirá de seus representantes eleitos! A trajetória de Lewandowski demonstra, de maneira inequívoca, a mentalidade autoritária que o caracteriza — apenas mais uma peça do mosaico do autoritarismo que move o consórcio reinante no Brasil e que é dever dos cidadãos conscientes denunciar.

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