Foto – Marcelo Camargo
Sindicalistas ganharam cargos na Vale, na Gerdau e na Neonergia; procurado, o fundo de pensão disse que mudanças seguem ‘tendência de mercado’ e visa aumentar a participação de grupos ‘historicamente subrepresentados’
O fundo de pensão do Banco do Brasil, a Previ, adotou medidas que favoreceram a nomeação de sindicalistas, membros de associações e pessoas sem experiência em cargos executivos para conselhos de empresas. Com R$ 270 bilhões sob gestão, a entidade está entre os principais investidores de algumas das maiores companhias do País, como Vale, Gerdau, BRF e Ambev. Essas participações dão ao governo influência na escolha de nomes para colegiados em negócios privados.
Procurado, o fundo disse que mudanças seguem tendência de mercado e visam aumentar participação de grupos “historicamente subrepresentados”. Também afirmou que sindicalistas indicados atestaram capacidade técnica e já haviam ocupados cargos em conselhos de empresas e na Previ. “Ainda assim, dos candidatos que participam da Seleção de Conselheiros, observou-se que a grande maioria (88,76%) possui graduação completa em pelo menos uma das 5 grandes áreas: Administração, Contabilidade, Direito, Economia e Engenharia.”
Os critérios utilizados para decidir quem ocupa esses postos são definidos a cada ano por meio da publicação de um edital. Em 2023, primeiro ano do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, o documento manteve regras herdadas das gestões anteriores, que garantiam pontuações maiores a candidatos com formação em áreas específicas, como economia, administração e direito. Também preconizava experiências profissionais em cargos de direção e de conselhos da própria Previ ou de empresas.
Desde o ano passado, no entanto, passou a estabelecer apenas parâmetros mínimos de formação, em que qualquer graduação e especialização têm o mesmo peso. Ainda equiparou passagens por postos de direção em sindicatos, associações e federações a experiências em cargos no próprio fundo e em empresas.
No ano passado, já com a mudança em vigor, sindicalistas passaram a fazer parte dos conselhos de grandes empresas privadas., com direito a salários de executivos.
É o caso de Márcio de Souza, ex-presidente do sindicato dos bancários de Petrópolis e, hoje, membro do conselho fiscal da Vale. O ex-diretor da Federação dos Bancários de São Paulo e ex-secretário-geral da Contraf Marcel Juviniano Barros está no conselho fiscal da Gerdau Metalúrgica. Ernesto Shuji Izumi, ex-secretário de Formação da Contraf, foi indicado para o mesmo posto na Neoenergia.
O impacto do afrouxamento das regras de seleção ainda foi limitado pelo fato de que parte dos mandatos de conselheiros indicados pela Previ começou em 2023, quando as normas antigas ainda estavam em vigor, e vão até meados deste ano, quando novas indicações serão realizadas.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Previ defendeu que as alterações realizadas nos editais seguem “tendência de mercado”, levam em consideração outras competências, como “soft skills” (habilidades relacionadas ao comportamento), e buscam garantir maior participação de mulheres e integrantes da comunidade LGBT. Também afirmou que os sindicalistas indicados para conselhos em 2024 apresentaram requisitos técnicos.
“Wagner Nascimento, Márcio de Souza, Marcel Barros e Ernesto Izumi são indicados pela Previ em empresas participadas muito antes de 2024, quando foi feita a alteração no edital da Seleção de Conselheiros para ter mais variedade de formações e experiências profissionais, como é cada vez mais necessário para atender as demandas do mercado. Todos os quatro também participam ou já participaram ativamente da governança da Previ, como membros eleitos pelos associados para representá-los na Entidade: Wagner Nascimento é diretor de Seguridade da Previ desde 2020; Márcio de Souza é diretor de Administração da Previ desde 2018; Marcel Barros foi diretor de Seguridade de 2012 até 2020; e Ernesto Izumi foi membro do Conselho Deliberativo de 2020 até 2024.”
Os críticos das mudanças alertam para o risco de favorecimento a perfis similares ao do presidente da Previ, o sindicalista João Luiz Fukunaga, que já é conselheiro da Vale e do Aeroporto Internacional de Guarulhos. Graduado em história e ligado ao PT, ele foi presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo e auditor sindical da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf), vinculada à Central Única dos Trabalhadores (CUT).
Sua formação acadêmica e a falta de experiência na administração de ativos financeiros ou na gestão de empresas fez com que sua nomeação à presidência da Previ fosse alvo de questionamentos.
A Justiça chegou a determinar por duas vezes o afastamento de Fukunaga do cargo por não atender a requisitos técnicos. O Tribunal de Contas da União (TCU) apura, em uma frente, se a nomeação dele seguiu todos os ritos e normas de governança do fundo. Em outra, investiga as causas de uma perda de R$ 14 bilhões no Plano 1 da Previ. Ao determinar a instauração da auditoria, em fevereiro, o ministro Walton Alencar Rodrigues alertou que, em 2024, os investimentos do plano renderam apenas 1,58%.