‘Quadro fiscal com Lula 3 está bem pior do que com Dilma 2’, diz ex-diretor do BC

Foto – Foto: Pixabay

Para o economista Tony Volpon, a situação é mais grave hoje, porque a dívida pública aumentou muito e, com os juros nas alturas, o endividamento está crescendo de forma muito mais rápida do que antes.

Em linha com a frustração gerada no mercado financeiro pelo pacote de corte de gastos proposto pelo governo Lula, o economista Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central (BC) e professor adjunto da Georgetown University (EUA), diz que a reação negativa da banca e dos investidores às medidas era previsível e faz uma avaliação sinistra do quadro fiscal e da economia do País na atual gestão. “Era óbvio para qualquer pessoa que, se o pacote de corte de gastos do governo fosse fraco, haveria uma reação negativa do mercado”, disse Volpon ao Estadão.

Segundo ele, a situação fiscal do País com Lula 3 está “bem pior” do que com Dilma 2, porque os juros, que incidem sobre a dívida pública, estão mais ou menos no mesmo nível daquela época, mas o endividamento está muito maior e crescendo de forma mais acelerada. “A taxa de juros real (acima da inflação) que o Tesouro está praticando hoje está no mesmo nível da que vigorava no pico da crise de 2015 e 2016″, afirma. “Só que, agora, como a dívida bruta está perto de 80% do PIB (Produto Interno Bruto), enquanto lá atrás estava em 57% do PIB, ela cresce muito mais rápido. É um quadro muito mais delicado.”

Elementos negativos

Na visão de Volpon, não há como o País ter um crescimento econômico de 3% do PIB, como está ocorrendo, com o juro real na faixa de 7% ao ano, a inflação em alta, o dólar nas alturas e a Bolsa em baixa. “Não existe essa mágica”, diz. “Esses quatro elementos são negativos para o crescimento futuro. Então, é inevitável que haja uma queda na economia. Esse aperto monetário vai ter um impacto sobre o nível de atividade.”

Para ele, quando a relação dívida/PIB é muito alta e sua trajetória é percebida como “insustentável”, há duas soluções possíveis. Uma é reduzir os gastos e gerar superávits primários, para estabilizá-la ou até baixá-la com o tempo, que é algo que o governo não parece empenhado em fazer. A outra é reduzir a relação dívida/PIB por meio do aumento da inflação, porque todo o estoque da dívida que não é indexado à variação média dos preços acaba perdendo valor. Este é, aparentemente, o caminho que o governo decidiu seguir.

É por isso, de acordo com ele, que os investidores estão exigindo prêmios cada vez maiores para absorver o volume de títulos públicos que o Tesouro tem de colocar no mercado, para financiar os déficits fiscais recorrentes e a dívida pública crescente. “O governo está sinalizando que não está disposto a controlar suas contas pelo lado bom, o que significa que ele não consegue entregar para o mercado uma perspectiva crível de que, em algum momento, no futuro próximo, vai obter um superávit primário que seja suficiente para estabilizar a relação dívida/PIB”, afirma. “Aí o mercado fala ‘bom, eles estão sinalizando que vão querer fazer isso pelo lado mau, pelo lado da inflação’ e passa a exigir prêmios maiores, para não correr risco de ficar no prejuízo. O mercado não é bobo.”

Volpon ressalva que, hoje, a economia está indo “relativamente bem” e ao menos por ora não há uma recessão no horizonte, enquanto com Dilma o País enfrentou uma retração profunda na atividade econômica, a maior de que se tem notícia em todos os tempos, com queda acumulada de 7% no PIB em 2015 e 2016, o que acabou agravando o problema. Mas agora, ao contrário do que aconteceu com Dilma, quando havia uma perspectiva de mudança política, que acabou sendo o seu impeachment, a próxima eleição, em 2026, ainda está muito longe. Isso significa que se nada mudar, como tudo parece indicar, o País terá de conviver com essa situação até lá, com resultados nefastos nos preços dos ativos financeiros e na economia. “Não dá para o mercado se ancorar hoje numa possível mudança de governo em 2026.”

O economista diz que não consegue “decifrar” aonde o governo está querendo chegar, ao expandir de forma descontrolada os gastos, aumentando o déficit fiscal e a dívida pública, num momento em que o mercado emite sinais de que é preciso manter as contas sob controle. “Eles viram o que aconteceu no governo Dilma. Há muitos paralelos entre o que a gente está vivendo hoje e o que viveu no governo Dilma 2. Eu não consigo entender o que passa na cabeça deles, como eles imaginam que a economia estará daqui a dois anos, porque isso não vai acabar bem para eles”, diz.

“O Lula e a galera podem culpar o mercado, dizer que a Faria Lima está fazendo isso de propósito para prejudicar o governo, mas isso não deveria impedi-los de concluir que o final não vai ser feliz. Eles acham que vão ganhar a eleição de 2026 culpando a Faria Lima? Que a inflação dos alimentos vai estar bombando em 7% ou 8% e as pessoas ainda vão votar neles, porque a culpa é da Faria Lima? Eles podem estar lá em Brasília pensando ‘ah, esse mercado malvado levou o dólar a R$ 6′. Mas isso vai acabar derrubando politicamente o governo. A saída pela inflação é altamente impopular.”

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