TCU analisa ação que pode gerar dívida de R$ 3,2 bilhões ao governo

Inicialmente, TCU havia reconhecido indenização bem menor, de R$ 7,2 milhões, mas voto de ministro pode aumentar dívida em 454 vezes

O Tribunal de Contas da União (TCU) volta a analisar, nesta quarta-feira (4/6), processo que pode transformar dívida do governo federal inicialmente em R$ 7,2 milhões para algo 454 vezes maior, de R$ 3,2 bilhões – valor superior ao orçamento previsto para 10 ministérios da gestão Lula em 2025.

A ação tem como base indenização devida pelo governo à Companhia Docas de Imbituba (CDI). A empresa foi responsável pela construção do Porto de Imbituba, em Santa Catarina, no ano de 1922. Ocorre que o local foi estatizado durante o governo de Getúlio Vargas, em razão da 2ª Guerra Mundial, e posteriormente concedido à CDI em 1942, ao longo de 70 anos, isto é, até 2012. Ao fim desse período, a empresa passou a cobrar indenização pelos serviços e investimentos prestados no espaço.

Desde então, há uma série de discussões sobre qual o valor realmente deve ser indenizado pelo governo federal. A CDI pediu, inicialmente, R$ 981 milhões. Em 2015, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) calculou montante bem menor, de R$ 7,2 milhões. Já em 2016, a Secretaria de Políticas Portuárias reconheceu que a dívida seria de R$ 3,2 bilhões.

O caso, então, chegou ao TCU. Em meio às divergências, o tribunal de contas ficou responsável por dar o parecer final sobre a matéria e, em 2020, entendeu que R$ 7,2 milhões seria o valor devido da indenização. Parecia tudo resolvido.

No entanto, movimentos realizados nos últimos meses indicam que o caso pode tomar novo rumo. Atendendo a um pedido de reexame da CDI e contrariando a Antaq e duas áreas técnicas do TCU, o ministro Jhonatan de Jesus, ex-deputado federal pelo Republicanos de Roraima, decidiu reformar o entendimento da Corte e votar a favor do reconhecimento da dívida maior, de R$ 3,2 bilhões.

Já na sessão do último dia 30 de abril, um novo fator ganhou destaque: o ministro-relator, Aroldo Cedraz, que já havia se manifestado pela manutenção do entendimento do TCU em 2020, se aliou a Jhonatan de Jesus e aderiu à revisão.

A mudança de posicionamento de Aroldo Cedraz surpreendeu seus pares no TCU. Logo, o ministro Jorge Oliveira solicitou que a discussão fosse adiada por mais 30 dias, alegando que não sabia que havia uma adesão do relator, Aroldo Cedraz, ao voto do revisor, Jhonatan de Jesus.

Também surpreso, o ministro Bruno Dantas, ex-presidente do tribunal de contas, aproveitou para apresentar um voto divergente, mantendo o prejuízo menor, de R$ 7,2 milhões. “Eventual discordância em relação a essa decisão, além de estrangular a boa técnica e a razoabilidade, significaria tutelar interesses particulares com o objetivo de garantir eventual ressarcimento a que o recorrente entende ter direito”, disparou.

O ex-presidente do tribunal pontuou ainda que eventual decisão favorável à CDI seria uma verdadeira reviravolta sobre os diversos pareceres técnicos já proferidos sobre a questão, seja pela Antaq, pelo Ministério da Infraestrutura ou pelas unidades instrutoras do TCU. “Nós estaremos servindo de agente de cobrança de uma dívida que definitivamente não se sustenta, seja factualmente seja juridicamente”, disse Bruno Dantas.

“Além de contrariar a boa técnica, eventual decisão favorável à CDI esvaziaria a farta jurisprudência desta Corte de que não cabe ao controle externo tutelar interesses privados, em especial para substituir o gestor em decisões validamente fundamentadas, a fim de resguardar supostos direitos eventualmente reclamados pelas partes”, prosseguiu ele.

Durante o julgamento, o ministro Walton Alencar indicou seguir o voto de Bruno Dantas, deixando o placar em 2 a 2. A discussão será retomada nesta quarta-feira.

Entenda, ano a ano, as reviravoltas do caso:

  • 2012: encerrada a concessão, CDI pede indenização de R$ 981 milhões por investimentos realizados;
  • 2015 e 2016: Antaq reconhece o direito da CDI de ser indenizada, mas calcula valor de R$ 7,2 milhões pelos investimentos não amortizados;
  • 2016: secretário de Políticas Portuárias diverge da Antaq e recalcula dívida para R$ 3,2 bilhões;
  • 2018: ministro dos Transportes, Portos e Aviação Civil solicita pronunciamento do TCU;
  • 2020: TCU avalia a questão e entende que cálculo de R$ 7,2 milhões é o correto;
  • 2020: em atenção a acórdão do TCU, ministro da Infraestrutura anula decisão de antecessor e aprova análise da Antaq feita em 2015, que reconheceu a dívida de R$ 7,2 milhões;
  • 2020: CDI apresenta pedido de reexame;
  • 2024: TCU publica acórdão, sob relatoria de Aroldo Cedraz, para Antaq ratificar ou retificar informações. Agência reguladora mantém entendimento que reconhece dívida de R$ 7,2 milhões;
  • 2025: ministro Jhonatan de Jesus atende novo recurso da CDI e vota por reaver prejuízo para R$ 3,2 bilhões, contrariando os entendimentos mais recentes da Antaq, do Ministério da Infraestrutura e de duas áreas técnicas do tribunal. Desta vez, ele é acompanhado por Aroldo Cedraz, que surpreende os pares ao mudar o posicionamento.

Crédito Metrópoles

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