Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo
Vigilância teria sido feita por meio do software espião FirstMile; defesa do ex-ministro e a agência não quiseram comentar
Investigadores da Polícia Federal levantaram indícios de que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) monitorou o general da reserva Augusto Heleno, um aliado próximo de Jair Bolsonaro, enquanto ele comandava o Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Realizaram a vigilância através do programa espião “FirstMile”, que mapeava a localização de celulares em todo o país.
Dados da investigação mostram que consultaram um número de celular usado por Heleno 11 vezes no “FirstMile” em maio de 2020. A Abin colocou o aparelho telefônico, de uso “funcional” e vinculado a assuntos de trabalho — não registrado em nome do militar para evitar rastreamento. Isso significa que alguém próximo ao ex-ministro sabia que ele usava essa linha telefônica.
Procuradas, a defesa do ex-ministro e a Abin não quiseram comentar. Interlocutores de Heleno dizem que o ex-ministro usou diversos números fornecidos pelo governo durante os quatro anos em que foi chefe do GSI. No mesmo período, ele manteve a sua linha de telefone pessoal, que não foi monitorada
A possibilidade de “Abin paralela” ter espionado Heleno, realizando “espionagens ilegais”, surpreendeu os integrantes da investigação. Até porque o ex-ministro é suspeito de comandar uma suposta estrutura informal de inteligência durante o governo Bolsonaro em campanhas em 2022.
“Desconfiança”
Uma das suspeitas dos investigadores é que o monitoramento de Heleno foi fruto de uma “desconfiança” de Bolsonaro em relação a aliados próximos.
Semanas antes da “espionagem” feita pela Abin, o ex-juiz Sergio Moro havia pedido demissão do cargo de ministro da Justiça após acusar o então presidente de “tentar interferir na Polícia Federal”.
No mesmo período, o GSI, foi alvo de reclamações de Bolsonaro, que estava insatisfeito com a atuação do órgão. O então presidente se queixava com frequência da escassez de informações de inteligência para tomar decisões estratégicas ou mapear riscos prementes ao seu governo.
A circunstância do monitoramento de Heleno ainda está sob investigação. A Polícia Federal instaurou um inquérito para apurar um suposto esquema de espionagem ilegal da Abin durante o governo Bolsonaro após reportagem do GLOBO revelar a utilização do “FirstMile” em março do ano passado.
O programa israelense utilizava uma brecha na rede de telefonia brasileira para obter dados da conexão de celulares — que permitiam rastrear a localização de aparelhos utilizados por alvos selecionados.
Os números de telefone monitorados pela Abin estão sendo identificados pela PF com o apoio da Controladoria-Geral da União. Além de Heleno, foram alvos de suposta espionagem da “Abin paralela” políticos, assessores parlamentares, jornalistas, ambientalistas e advogados, segundo investigadores.